Há uma nova consciência feminista em relação aos vários tipos de agressão sofrida pela mulher: a física e a psicológica, a simbólica e a literal, a doméstica e a institucional.
Há entre nós o saudável despertar de uma nova consciência feminista — fala-se até em neofeminismo — em relação aos vários tipos de violência sofrida pela mulher: a física e a psicológica, a simbólica e a literal, a doméstica e a institucional, e a que se faz por meio do assédio ou do abuso sexual. Não têm faltado exemplos para todas as categorias, inclusive a que utiliza a lei, como o PL 5069/13, de Eduardo Cunha, dificultando o aborto de vítimas do estupro (a esperança é que antes seu mandato seja abortado). Mas o episódio que mais chamou a atenção no Rio foi o das agressões do secretário de Governo do município e pré-candidato à prefeitura, Pedro Paulo Carvalho, contra a ex-esposa. Tão lamentáveis quanto os incidentes foram as tentativas do ex-casal de minimizar a gravidade do ocorrido. Numa entrevista coletiva, citaram como corriqueiras brigas como as deles. “Quem nunca exagerou em uma discussão?”, ele perguntou, sem considerar que exagerou no exagero, pois a vítima, além de chamada de “vagabunda” e “piranha”, perdeu um dente com os socos que levou.
Apesar disso, da confissão do autor e dos registros na polícia constando até ameaças de sequestro da filha, ela garantiu — “Pedro nunca foi um cara agressivo” — e culpou a imprensa por ter “transformado num inferno” as vidas dela, dele e da menina, para quem, no entanto, o “inferno” maior talvez tenha sido presenciar as agressões, como aconteceu. Não é um fenômeno de fácil explicação, e chegou-se até a atribuí-lo a uma variante da síndrome de Estocolmo, em que a vítima se identifica com o algoz. Também a presidente do PMDB Mulher manifestou solidariedade, mas que peca por um detalhe: ela pediu uma “segunda chance” para Pedro Paulo, esquecendo que, na verdade, seria a terceira.
Se tudo isso provocou uma justa indignação, não entendi o silêncio das atentas neofeministas em face de uma cena de violência consentida, ainda mais que de mulher contra mulher. Falo das imagens do rosto contorcido da lutadora americana Ronda Rousey, em consequência do chute que levou da compatriota, a americana Holly Holm — tão brutal que teve de se submeter a uma cirurgia plástica no lábio partido. Se fizesse o mesmo numa briga de rua, a agressora seria presa. Na rinha, desculpe, no octógono, foi consagrada e aplaudida como heroína por cerca de 70 mil pessoas na Austrália. “Recebi tanto amor e carinho”, disse a vencedora, “que não poderia deixar de retribuir”. Quanto a mim, um dinossauro, sou do tempo em que se dizia que violência gera violência, e se retribuía amor e carinho com beijos e abraços, não com pontapés no rosto. Desde criança aprendi, e procuro ensinar aos meus netos Alice e Eric, que chute se dá em bola, não nos outros nem nas outras. No rosto feminino então, nem pensar.