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Vida difícil

 

A vida de Lula não está fácil, e nada indica que melhorará nos próximos meses. O panelaço a nível nacional, alguns julgam o maior dos últimos tempos, indica que a movimentação contra o PT voltou a mobilizar a população, cujo estado de espírito já havia se revelado na pesquisa Ibope que deu a Lula uma mega taxa de rejeição.

Investigado em várias frentes, ele corre o sério risco de vir a ser indiciado por diversos crimes que começam a ser explicitados. A unanimidade do plenário do Conselho Nacional do Ministério Público que derrubou a liminar do deputado petista Paulo Teixeira, que suspendera os depoimentos de Lula e Marisa na semana passada, tem um sentido político inegável.

Lula vai perdendo as blindagens que o protegiam, e várias forças-tarefas vasculham sua atividade nos últimos anos. O Ministério Público de Brasília aumentou o foco sobre a investigação da atuação do ex-presidente como lobista de empreiteiras aqui e no exterior, e já há indícios de que ele praticou tráfico de influência em favor da Odebrecht no país e no exterior.

Por sua vez, a força-tarefa do Ministério Público de São Paulo, formada pelos promotores Cassio Conserino, Carlos Blat (natural), Fernando Henrique de Morais e José Guimarães Carneiro teve confirmada a sua legalidade na investigação do tríplex do Guarujá, e deverá convocar novamente o ex-presidente e dona Mariza para depor.

A anotação encontrada com Marcelo Odebrecht que se refere a R$ 12 milhões para o IL (Instituto Lula) parece ter procedência, pois começam a vir a público antigas reportagens que falam sobre a ideia de Lula de construir um prédio novo para o Instituto Lula, e cita o amigo do peito José Carlos Bumlai como o arrecadador de dinheiro entre os empresários.

Tudo vai se encaixando como peças de um quebra-cabeças pacientemente montado pelos procuradores da Lava-Jato em Curitiba com o auxílio da Polícia Federal. Não há histórico de irresponsabilidades nas centenas de prisões já feitas, e é improvável que tenham cometido um erro gigantesco como o de acusar o marqueteiro João Santana sem condições de provar as irregularidades.

O coordenador dos Procuradores, Dalton Dallagnol, me disse certa vez que quando uma prisão é decretada, há quase 100% de certeza de que o acusado será condenado, pois as provas são muito robustas. Nesse caso do marqueteiro, o Procurador Carlos Fernando dos Santos Lima disse que nunca haviam conseguido um conjunto de provas tão contundentes quanto nesta 23 fase da Operação Lava-Jato.

Mais uma vez as investigações vão encaixando as peças do quebra-cabeças, tornando difícil contestação. Nos documentos de Marcelo Odebrecht foram encontradas há meses anotações que colocam sentido nos fatos posteriormente descobertos. Como por exemplo, avisar (a Edinho Silva, hoje ministro, ontem coordenador da campanha presidencial) que a conta na Suíça pode chegar a ela, numa clara referência à presidente Dilma.

Uma conta naquele país, de João Santana, já foi confiscada pelas autoridades financeiras suíças. E há também uma anotação que fala em liberar (dinheiro) para o Feira (codinome de João Santana). Difícil imaginar que a Odebrecht pagasse a João Santana por fora pelas campanhas presidenciais que ele andou fazendo para políticos ligados a Lula e ao PT na América Latina.

Seria um crime de qualquer maneira, pois as contas offshores não foram declaradas, mas não faz sentido que tenha sido usado para tal tarefa o engenheiro Zwi Skornicki, representante oficial no Brasil do Estaleiro Keppel Fels, considerado um dos principais operadores de propinas ligado à Petrobras.

As acusações da Força-Tarefa da Lava-Jato vão sendo provadas uma a uma. Eles acusaram a Odebrecht de ter mandado para o exterior, desde o início da Operação, vários executivos, para protegê-los e dificultar as investigações. Ontem, soube-se que um deles, o executivo Fernando Miggliacio, que tinha sua prisão pedida nessa 23 fase, foi preso em Genebra tentando encerrar contas bancárias.

Ele seria o encarregado de controlar as contas offshore, como as que encaminharam o dinheiro para João Santana no exterior, e fazer os pagamentos de propinas para diversas autoridades em países em que a empreiteira brasileira atua. Tudo indica que estamos chegando à reta final desse quebra-cabeças, que já tem praticamente todas as suas peças encaixadas.

O Globo, 24/02/2016