A área de preservação que Temer liberou por decreto para a mineração no Amapá é do tamanho do Espírito Santo, metade de Portugal, equivale a duas vezes Israel e é maior do que a Suíça, a Bélgica e a Dinamarca. Essas comparações, que recolhi de artigos e cartas de leitores, dão a medida do absurdo que, diante dos protestos, foi suspenso, isto é, apenas adiado por 120 dias para quando, quem sabe, a pátria estiver mais distraída.
Entre as manifestações contra essa tenebrosa transação, ainda como na canção de Chico Buarque, houve uma em Ipanema a que compareceram meus netos Alice e Eric, demonstrando que a causa é uma das poucas que ainda motivam os jovens — e até crianças. Mas a preocupação do presidente é aliciar apoio no Congresso para evitar que a nova denúncia da Procuradoria contra ele chegue ao STF. Acontece que o governo, como observou Rodrigo Maia, não avaliou o impacto que a medida teria na sociedade. E não apenas aqui.
Já na sua constrangedora viagem à Noruega, o vexame maior não foi nem confundir com o da Suécia o soberano do país que visitava, mas receber puxão de orelha da primeira-ministra Erna Solberg sobre a corrupção no Brasil, além do anúncio de que seria reduzido o repasse para a preservação de nossa floresta. O país nórdico, que já investiu quase R$ 3 bilhões em projetos de proteção da região, comunicou que cortaria pela metade os 400 milhões que Brasil recebia. A razão é que as autoridades norueguesas, ao contrário das nossas, estão muito insatisfeitas com o “recente aumento do desmatamento em território brasileiro”.
Há quase 30 anos, num crime mais do que anunciado pela própria vítima, era assassinado no Acre o líder seringueiro Chico Mendes, o nosso protomártir da causa ambiental. Ele forneceu inclusive ao presidente da República a lista dos suspeitos e nada foi feito. Disse que seria assassinado no dia 30 de dezembro de 1988. Foi morto oito dias antes, aos 44 anos de idade.
Considerado pelo “New York Times” “um símbolo de todo o planeta”, premiado pela ONU com o Global 500, exaltado por importantes organizações internacionais, como o Bird, foi preciso ser executado (de tocaia) para ser reconhecido em seu país como um herói trágico que deu a vida em defesa dos chamados povos da floresta, inscrevendo a Amazônia na agenda planetária como patrimônio da Humanidade.
Acreditava-se que, depois dessa história de vida e dessa saga épica que comoveu o mundo, ninguém ousaria contrariar o legado de Chico Mendes, desrespeitar sua luta e ofender sua memória.
Michel Temer ousou.