A criação de aprendizes legais avançou com muita rapidez no número de participantes. Hoje, temos perto de 100 mil deles no Brasil inteiro, com uma perspectiva bastante animadora. O país acordou para a importância da aprendizagem, que não se limita a um tempo determinado. É para toda a vida, como nos ensina a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Correndo em faixa paralela, temos os estagiários, que, em nível nacional, já são mais de 550 mil. Eles deram vida aos Centros de Integração Empresa-Escola (CIEEs), a partir do primeiro deles, criado há 50 anos, em São Paulo. Como são entidades de natureza filantrópica, gozam de grande simpatia por parte da população brasileira, que nelas vê uma nobre atividade de amparo aos jovens.
Por isso mesmo, entende-se pouco a reação de parte do governo federal aos seus propósitos. Mesmo correndo o risco de impopularidade, certas autoridades persistem na tese de que o CIEE não realiza atividades de assistência social — e por isso mesmo não deve ter direito a expedir certificados de filantropia. É uma novidade do atual governo, pois há anos isso vinha ocorrendo, com toda tranquilidade, inclusive sob o amparo da Constituição federal.
Nos seus 50 anos de atividade, o CIEE atendeu a mais de 13 milhões de estagiários, fornecendo-lhes bolsas-auxílio, que têm a propriedade, em quase todos os casos, de representar o primeiro emprego dos jovens desamparados. Não se entende a razão de pretender o governo o monopólio da assistência social, quando isso não tem o menor cabimento. Por que não essa parceria? O atendimento aos jovens se faz dentro do que preceitua o Plano Nacional de Assistência Social, beneficiando nitidamente pessoas carentes.
No Ministério do Desenvolvimento Social, há quem argumente, de modo falacioso, que o CIEE não precisa disso. “Vocês trabalham com empresas poderosas, por que elas não arcam com tudo?” É uma forma de enxergar com nítido preconceito. No Rio de Janeiro, com 30 mil estagiários, trabalhamos com mais de 3 mil empresas, oneradas por uma brutal carga tributária, como não há outro exemplo no mundo. Querer sangrar ainda mais os seus orçamentos é miopia pura.
Esse processo discriminatório foi ganhando força e hoje incomoda. Parece que os estagiários constituem uma casta a ser reprovada, quando na verdade são figuras beneméritas, que enriquecem as empresas e as instituições de um modo geral. A todos que servem com muita competência e dedicação. Com os aprendizes, hoje são respeitados na plenitude dos seus direitos.
Daí o seu crescimento exponencial, com o reconhecimento do que se faz em termos de aprendizagem. Para tanto, o Ministério do Trabalho colabora de forma positiva. Seria o caso, agora, de o Ministério da Educação (MEC) identificar de modo claro o que se entende por aprendizagem — e aí se fecharia o cerco de proteção a essa atividade.
Convém lembrar que um parecer do antigo Conselho Federal de Educação, ao analisar as virtualidades do ensino supletivo, hoje educação de jovens e adultos, listou os seus elementos nucleares: aprendizagem, qualificação, suplência e suprimento. Esse último é o que chamamos de educação permanente ou continuada, que ganhou grande força nos últimos anos.
Seria conveniente que o MEC, quem sabe por intermédio do Conselho Nacional de Educação, pudesse inspirar um novoparecer, dando foros de modernidade ao conceito deaprendizagem. De todo modo, surgiu uma luz no horizonte,com a decisão tomada pela Justiça da cidade paulista de Campinas, reconhecendo as atividades de aprendizagem do Instituto Dom Bosco, de longa tradição na educação brasileira,e da Legião Mirim. Foram deferidos os seus certificados.Talvez, por aí se inicie o fim dessa lamentável situação demal-estar.
Correio Braziliense, 4/5/2014