RIO DE JANEIRO - A visita de Bento 16 à Turquia foi o seu primeiro e mais bem-sucedido gesto de chefe de Estado, mostrando que Joseph Ratzinger não é apenas um intelectual da teologia nem um inquisidor das coisas da fé. Como líder religioso, ele sabia que as multidões não o esperariam na missa que rezou no santuário da Virgem Maria, próximo das ruínas da cidade histórica de Éfeso: juntou apenas 250 convidados.
Mesmo assim, nos seus pronunciamentos, ele acentuou as convergências do catolicismo romano com o ortodoxo, dando mais um passo para a aproximação das duas igrejas, separadas há séculos.
Também para os muçulmanos ele lembrou que as diferenças das duas religiões não afetam o principio básico de cada uma, que é a crença num só Deus.
Onde o sucesso da visita foi mais relevante foi mesmo no campo diplomático. No difícil papel de líder religioso e chefe de Estado, Bento 16 teve um gesto de reconciliação após uma declaração infeliz feita num passado recente. A visita valeu como um pedido de desculpas e como tal foi aceita pelo Estado da Turquia.
Ícone branco do Ocidente, o papa deu um passo importante na aproximação das duas civilizações, que ameaçam um confronto apocalíptico. Não serão armas nem a tecnologia sofisticada do mundo ocidental que farão o milagre da paz entre as duas civilizações.
Do ponto de vista estritamente religioso, a visita de Bento 16 segue a linha apostólica de São Paulo: não adianta converter os convertidos. Paulo tornou-se o apóstolo dos gentios, daqueles que não tinham a mesma fé. E, com isso, de certa forma mudou o mundo. Sozinho, Bento 16 não pode fazer o mesmo. Mas seu exemplo pode motivar outros gestos de paz que tragam a concórdia entre todos os povos da terra.
Folha de S. Paulo (SP) 3/12/2006