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Um enigma chamado vida

 

Um americano que confessou um assassinato por pensar que estava morrendo, foi preso depois que suas condições de saúde melhoraram. James Brewer pode ser condenado à pena de morte pelo assassinato de um vizinho, em 1977. Convencido de que estava à beira da morte após sofrer um derrame, ele confessou o assassinato de Jimmy Carrol, então com 20 anos. Em 1977, Brewer foi preso e acusado do assassinato de Carrol, mas, enquanto estava sob liberdade condicional, fugiu do Tennessee para Oklahoma.


Mudou seu nome para Michael Anderson e passou a viver com a esposa na cidade de Shawnee. Os dois se tornaram membros ativos da igreja local, onde criaram um grupo de estudos da Bíblia. Mas após sofrer o derrame, Brewer ligou para a polícia, no começo do mês. Detetives disseram que Brewer admitiu ter matado Carroll por pensar que o jovem tentava seduzir sua esposa.


"Ele quis limpar sua alma", disse o detetive Tony Grasso, a quem Brewer confessou o crime. Folha Online"PREZADO detetive Tony Grasso: quem lhe escreve é James Brewer, aquele mesmo James Brewer de quem, há poucos dias, o senhor ouviu a confissão de um crime. E devo lhe dizer, detetive, que fiz essa confissão não apenas porque o senhor é um policial, mas sobretudo porque o senhor me pareceu um homem sábio e equilibrado. Naquele momento eu tinha chegado ao fundo do abismo de minha angústia. Poucos dias antes eu havia sofrido um derrame cerebral do qual me recuperara parcialmente. Essa recuperação, contudo, não me deu qualquer esperança. Eu tinha certeza de que sofreria um novo derrame e que, esse sim, seria mortal. E não queria morrer com a culpa que carrego dentro de mim há 32 anos. Como lhe contei, detetive, eu matei um homem, um rapaz chamado Jimmy Carrol, que tinha então 20 anos de idade. Era um jovem bonito, simpático, e achei que estava tentando seduzir minha mulher.


Num acesso de fúria crivei-o de balas. Fugi para outra cidade, mudei de nome e mudei de vida. Tornei-me profundamente religioso, mas minha fé não me absolveu do pecado, ao contrário: ao longo dos anos, aquilo tornou-se uma carga insuportável.


Eu precisava confessar o crime, detetive. E a iminência da morte foi para isso um fator decisivo. O outro fator foi, naturalmente, a sua compreensão. Devo lhe dizer que fiquei muito aliviado.


Agora, detetive, o senhor me diz que posso ser condenado à morte. O que, para mim, é uma surpresa estarrecedora. Sim, eu sei que sou um assassino, e sei que a pena de morte é o castigo dos assassinos. Mesmo assim, não tinha me imaginado sendo executado. Essa possibilidade causa-me, devo lhe dizer, indignação. Então essa é a recompensa que mereço por ter sido honesto, por ter cumprido com minha obrigação?


Claro, o senhor pode me dizer que todos nós vamos morrer de qualquer jeito, seja por um derrame, seja por uma execução. E o senhor talvez acrescente que, neste último caso, estarei dando um exemplo que muita gente recordará.


Talvez o senhor tenha razão. Mas isso não me consola. E agora uma pergunta me persegue, me atormenta: por que, detetive, eu não tive um derrame mortal há 32 anos atrás, naquele dia fatídico em que apontei o revólver para Jimmy? Por que? Responda-me, detetive, se puder. Talvez me ajude a entender o que é este enigma chamado vida."


Folha de S. Paulo, 27/4/2009