Cunha perdeu o poder formal, mas não aquele que exerce à sombra, devido a uma riqueza acumulada durante anos: um precioso banco de dados
Pelo ineditismo, foi mesmo uma quinta-feira histórica (e histérica) essa que a revista americana “Forbes” anunciou como a que pôs “fim ao político mais poderoso e mais corrupto do Brasil”. Um certo exagero. É difícil eleger hoje um campeão na categoria. A cada dia aparece um candidato, embora Eduardo Cunha seja único. Na terra em que os vilões de novela costumam fazer mais sucesso do que os mocinhos, ele é detestado por 77% da população, talvez por ter feito jogo duplo, seduzindo e enganando governo e oposição. E é também arriscado falar em seu fim e até em vê-lo preso. Uma delação premiada sua abalaria a República. No balanço do seu afastamento pelo STF, que levou longos cinco meses para a decisão, os repórteres Cristiana Lôbo e Gerson Camarotti usaram termos como “incerteza” e “imprevisibilidade” para definir este momento nervoso em que não se sabe o que vai acontecer, nem eles, que conhecem como poucos os bastidores da Corte e pertencem a um time de craques que, explicando a política, transformaram a GloboNews no canal da moda.
Brasília ferveu. A presidente Dilma comemorou a decisão, mas lamentou que viesse tarde, já que gosta de atribuir a ele a responsabilidade pelo processo de impeachment, mesmo sabendo que a culpa maior foi dos 367 deputados que votaram a favor. O “cara de pau” revidou, ironizando que a vez dela está vindo. Inabalável, avisou que não renuncia nem ao mandato nem à presidência, e que vai recorrer. A quem? Ao Supremo, que por unanimidade o considerou delinquente? Ele lembra o sujeito da anedota que, caindo do 10º andar, diz, ao passar pelo terceiro: “Até aqui vai tudo bem”. Mas em se tratando de quem tem fôlego de gato, antes de chegar ao chão, se chegar, ele pode fazer muito estrago, não só aos que estão se despedindo, mas também aos que estão chegando.
Dizem que Michel Temer ficou aliviado, porque o seu ex-“vice” o vinha assediando com cobranças de cargos importantes. Mas, depois, ficou preocupado com as dores de cabeça que pode vir a ter. Cunha perdeu o poder formal, mas não aquele que exerce à sombra, devido a uma riqueza acumulada durante anos: um precioso banco de dados que lhe permitiu formar um enorme “cordão de rabos presos”. São aliados e adversários que lhe devem favores, dinheiro, cargos, conivência em uma velha trapaça ou tudo isso junto. Com sua tropa de choque, ele pode exercer influência sobre o presidente interino da Câmara ou sobre quem, por acaso, vier a ser eleito.
A “Forbes” se enganou mesmo. Para abater definitivamente Eduardo Cunha, só uma força, que ele é capaz de dar um prêmio de US$ 5 milhões a quem o livrar dela: a Lava-Jato.