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Trump e Alice: a fala infantil

 

Um levantamento exaustivo e um livro explosivo acabam de revelar, cada um à sua maneira, que Donald Trump é uma criança — ou pelo menos fala, age e é tratado como tal pelos que o cercam em casa e na Casa Branca. A análise de 30 mil palavras pronunciadas pelo presidente em discursos, entrevistas e declarações concluiu que seu vocabulário apresenta nível inferior ao de todos os que o antecederam na Presidência desde 1929 e, mais grave, equivale ao de uma criança de 8 anos, a idade de Alice, minha neta. Com a diferença de que, pelo que sei dos dois, o repertório vocabular e gramatical dela é mais rico do que os 140 caracteres que ele usa diariamente no Twitter. 

“Na verdade” — para citar uma expressão que ela adora — a comparação é desfavorável a ele, que dificilmente teria nível para frequentar a turma dela na escola, pois não seria capaz, por exemplo, de dar uma aula sobre Nelson Mandela, como ela fez recentemente. Em comum, talvez eles tenham apenas o narcisismo, que nela é infantil e nele, senil. Ela tem a pretensão de entrar para a ABL já e ele, bom, ele garantiu que é “um gênio muito estável” e “realmente esperto”. No caso de Alice, ainda há tempo para conserto; no dele, com 71 anos, talvez não tenha mais jeito. 

Em recente comício em Nashville, o presidente se dirigiu ao público assim: “Vocês são felizes por terem votado em mim. Têm sorte de eu ter dado a vocês esse privilégio”. No livro “Fogo e fúria — Dentro da Casa Branca de Trump”, que já é um best-seller nos EUA e tem lançamento previsto para março no Brasil, seu autor, o jornalista Michael Wolff, cita como um dos sintomas de imaturidade emocional a necessidade de aprovação e gratificação imediatas. A descrição que todos lhe fizeram do personagem retratado é a de uma pessoa com ego insaciável. “É tudo para e sobre ele. Esse homem não lê, não escuta”. Talvez por saberem dessa carência patológica é que os íntimos lhe dispensem tratamento diferenciado. 

Se essas avaliações do seu comportamento estiverem corretas, ele se encontra na fase de pré-adolescência tardia, com os sintomas típicos: inconstância, agressividade, entre outros distúrbios. 

Fenômeno político que tem desafiado a sociologia, o caso Donald Trump está precisando da psicologia para ajudar a entender esse seu inexistente mundo de maravilhas inventadas.

Há dias, numa conversa sobre ciência e religião, Alice declarou: “Eu acredito na evolução” (da espécie). Com certeza, ela não estava pensando em Donald Trump quando afirmou isso.

O Globo, 13/01/2018