Moda é moda desde que o mundo roda. No momento, os clichês mais batidos na mídia, na política, na sociedade em geral, podem ser resumidos a três: ética, credibilidade e transparência. Quem possui os três é uma vestal, um varão de Plutarco, uma reserva moral da nação, sendo que alguns, devido à idade, chegam ao ponto de serem conservas, compotas viscosas como as de pêssego ou de mamão.
Das três, somente a transparência pode ser medida objetivamente. Ética muda de tempos em tempos, de profissão em profissão, de pontos de vista e conveniências pessoais. Credibilidade pode ser escamoteada, depende de um processo, de provas muitas vezes macetadas.
A transparência merece o pleonasmo de ser mesmo transparente. Todos a invocam: governantes, instituições, pessoas físicas e jurídicas. Apesar de tanto e tamanhamente invocada, ela é raríssima, sobretudo entre pessoas públicas que são obrigadas, por temperamento ou por cálculo, a mostrar apenas o lado iluminado, como a Lua, escondendo as trevas do outro lado.
Neste particular, embora desagradando a totalidade da opinião pública, cito como exemplo de transparência o malhado presidente da Câmara, Severino Cavalcanti. Não me lembro de nenhum político importante que tenha aberto o jogo de forma tão transparente, sem temer as bordoadas que recebe diariamente, vinda de todos os cantos e modos. Guarda dinheiro no colchão, nomeia parentes que considera capazes, assume aquilo que todos praticam, de uma forma ou outra, sob disfarces técnicos ou estratégicos, ou seja, o fisiologismo que predomina na vida pública nacional. Para citar só um caso, basta lembrar a emenda constitucional que permitiu a reeleição de FHC e que poderá dar a Lula um segundo mandato. O que corre de toma-lá-dá-cá cria uma teia de favores e desfavores que permanece submersa na face oculta da impropriamente chamada vida pública, que, na realidade, se transforma em interesse privado de cada um.
Folha de São Paulo (São Paulo) 27/04/2005