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Sua Excelência, o livro

 

Quando se fala nos avanços tecnológicos que vislumbram a morte do livro pelo livro eletrônico e outras mágicas, eu respondo que o livro nunca acabará, porque ele é a maior das descobertas tecnológicas: cai e não quebra, não precisa de energia e, portanto, de ligar ou desligar. Pode ser levado para qualquer lugar, banheiro ou cama, com o que certamente os monitores de televisão não concorrem. O livro tem todos os programas de computadores e mais a diversidade de todos os assuntos guardados pela eternidade da escrita. E, se, por uma desgraça, essa história de mercado um dia tornar o livro dispensável, ainda restará o livro de poesia, pois a poesia não precisa de mercado e salvará o livro.


O governo tomou, ontem, uma decisão de grande importância na área da cultura -especificamente para o livro. Resolveu desonerar de todas as contribuições e taxas o livro nacional e estrangeiro. A Constituição Federal, no seu artigo 150, inciso VI, já prevê a imunidade de impostos. Mas, como sabemos, para fugir à divisão da arrecadação com os Estados, passaram a ser criados impostos com os eufêmicos nomes de contribuição e taxa. Nessa direção, nas leis sobre PIS/Pasep e Cofins, tocaram taxas absurdas que chegam a 9,25%. Os resultados foram o encarecimento do livro, a queda de venda no mercado editorial e a redução do número de exemplares de cada edição.


Sempre tive a cultura como minha causa parlamentar. As leis de incentivo à cultura, de estímulo à pesquisa cientifica e de proteção do patrimônio histórico foram iniciativas minhas, há mais de 30 anos, apresentando projetos e chamando a atenção do país para esse problema com a tese de que não basta ser uma potência econômica se não se é uma potência cultural.


Nesse sentido, consegui aprovar uma lei instituindo a Política Nacional do Livro, na qual o artigo 4º previa a isenção total de taxas para o mercado livreiro. Esse artigo foi vetado, mas o ministro Palocci assumiu comigo o compromisso de restabelecê-lo logo que a situação do país permitisse. Ontem ele cumpriu o prometido.


O presidente Lula, perante editores, livreiros e escritores, anunciou a decisão. O ministro Gil também já comandava essa reivindicação, incluindo-a no plano de cultura que está sendo coordenado por Galeno Amorim.


Compareci à solenidade e o presidente Lula pediu-me para dizer algumas palavras. Disse que não tivera tempo de elaborar um improviso como merecia o livro, mas o tema do livro ajudava.


O livro é o melhor amigo. Deus deu-me a graça de que, ao longo da minha vida, todo dia ele esteja ao meu lado, socorrendo-me, dando-me vida, acalmando os momentos em que as flores murcham.


Há um provérbio árabe que diz: "O paraíso sobre a terra pode estar nos belos seios de uma mulher, no lombo de um cavalo ou entre as páginas de um livro". Livro também nos diverte, num jogo de esconde-esconde. De noite, vou à minha biblioteca e não acho o livro no lugar em que o deixei. Ele já está adiante: é o bicho que mais anda na madrugada.


Para terminar, recordo um refrão que, se não me falha a memória, está no Quixote: "Os livros fazem muitos sábios, mas poucos ricos". Que o digam os poetas e Josué Montello, que já escreveu mais de cem!


 


Folha de São Paulo (São Paulo) 12/11/2004

Folha de São Paulo (São Paulo), 12/11/2004