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Somos todos Moro

 

Vão criar diversos Moros pelo país, comenta um experiente advogado criminalista diante da decisão do Supremo Tribunal Federal de “fatiar” a investigação da Operação Lava-Jato. Mesmo que não aconteça um improvável movimento de solidariedade de juízes de primeira instância, declarando-se incompetentes e devolvendo os processos para Curitiba, os que receberem esses processos se sentirão moralmente responsáveis pela continuidade de uma ação do Judiciário que tem amplo apoio da sociedade.

Por onde anda, o juiz Sérgio Moro é aplaudido – ontem foi em uma reunião em São Paulo – e juízes que receberem “fatias” do processo terão também a oportunidade de mostrar que a Justiça funciona.  A decisão STF de tirar da jurisdição da 13ª Vara Federal do Paraná, do juiz Sergio Moro, o processo sobre a corrupção no ministério do Planejamento, portanto, não vai inviabilizar a Operação Lava-Jato, mas coloca mais obstáculos a uma investigação que por si só é muito complexa, e com uma capilaridade impressionante pelo país e no exterior.

O que está sendo visto, e comemorado pelos governistas e advogados de acusados, como o fatiamento da Operação Lava-Jato, fragilizando a tese da Procuradoria-Geral da República de que o que está sendo investigado é uma organização criminosa que atuou em várias instâncias do governo federal além da Petrobras, pode ser revertido com um esforço adicional dos procuradores da Lava Jato, que pretendem dar apoio aos procuradores de São Paulo, e de outros estados, que forem investigar o caso.

Até onde se sabe os casos podem ser desmembrados entre a primeira instância no Rio e São Paulo, além de Curitiba, e será preciso montar equipes de apoio nesses dois Estados para que toda a expertise acumulada na investigação não se perca. 

Não é que só exista um juiz no país, como ironizou o ministro Toffoli, mas é de se lamentar que um caso que está sendo investigado desde março de 2014, com um grupo de cerca de 300 pessoas, entre membros do Ministério Público e da Polícia Federal, venha agora a ser desmembrado por questões técnicas, à luz de uma legislação que precisa ser analisada sob a ótica das modernas organizações criminosas.

Além do mais, no afã de tirar o caso das mãos do juiz Sérgio Moro, como salientou em seus comentários durante a votação o ministro Gilmar Mendes, o Supremo antecipou etapas e decidiu questões que poderiam ser definidas na primeira instância, como, aliás, votou o ministro Luis Roberto Barroso.

O ministro, embora tenha concordado em que no STF o caso deve ir para outro relator, e não para o responsável pelas ações da Lava-Jato, defendeu que, na primeira instância, coubesse ao juiz Moro decidir o tribunal adequado para conduzir as investigações do caso Consist. Se ele se afirmasse competente, e alguma parte discordasse, poderia interpor a "exceção de incompetência", a ser julgado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, cabendo dessa decisão o recurso especial ao STJ.

Barroso não compra a tese de que o que existe em atuação é uma grande organização criminosa que deveria ser investigada e julgada em conjunto,  que prevaleceu no julgamento do mensalão, apesar dos esforços de todos os advogados de defesa para desmembrar o processo naquela ocasião.

Há ministros, no entanto, a começar pelo relator Teori Zavascki, que consideram que não existe mesmo conexão entre os crimes e, portanto, os processos têm que ser desmembrados. Mas certos argumentos não fazem sentido, como o do ministro Dias Toffoli, que diz que a maior parte dos crimes de lavagem de dinheiro e falsidade ideológica foram cometidos em São Paulo, o que justificaria a atração de todos os processos para a Seção Judiciária do Estado de São Paulo, “ressalvada a apuração de outras infrações conexas que justifiquem conclusão diversa quanto ao foro competente".

O que deveria ser levado em conta, segundo especialistas consultados, é a origem do dinheiro desviado, e não onde ele foi “lavado”, mesmo por que há muito dinheiro circulando pelo exterior que pode ter entrado no país por diversos estados, mas proveniente de desvios de órgãos públicos dentro do esquema da organização criminosa. 

O Globo, 25/09/2015