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Sobre os muitos caminhos

 

O caminho da luz


DURANTE ANOS BUSQUEI A ILUMINAção”, disse o jovem. “Sinto que estou perto. Quero saber qual o próximo passo”.


“E como você se sustenta?”, perguntou o mestre.


“Meu pai e minha mãe me ajudam”.


“O próximo passo é olhar o sol por meio minuto”.


Quando acabou, o mestre pediu que descrevesse o campo a sua volta.


“Não consigo, o brilho dos raios ofuscou meus olhos”, respondeu o jovem.


“Quem mantém os olhos fixos no sol termina cego. Quem apenas busca a Luz e deixa suas responsabilidades para os outros esquece a condição humana e também termina cego”, foi o comentário do mestre.


O caminho da intolerância


Durante uma temporada teatral em Chicago, a atriz Sara Bernhardt foi violentamente atacada por um bispo da Igreja Episcopal, que a chamava no púlpito de “prostituta da Babilônia”.


Quando a temporada terminou, sempre com casas lotadas, Bernhardt enviou um cheque para o bispo, junto com um bilhete:


“Estou acostumada a gastar US$ 400 de publicidade sempre que chego numa cidade. Como o senhor se encarregou de metade da promoção, segue um cheque de US$ 200 para a paróquia”.


O caminho do tigre


O homem piedoso andava pela floresta quando viu uma raposa aleijada.


“Como ela se alimenta?”, pensou.


Neste momento, um tigre se aproximou com um animal entre os dentes. Saciou sua fome e deixou os restos para a raposa.


“Se Deus ajuda a raposa, também irá me ajudar”, pensou.


Voltou para casa e ficou esperando que os anjos lhe trouxessem comida.


Nada aconteceu. Quando já estava ficando fraco demais para sair e trabalhar, finalmente um anjo apareceu, perguntando:


“Por que você resolveu imitar a raposa aleijada? Levante-se, pegue suas ferramentas, e siga o caminho do tigre!”


O caminho da compaixão


O jovem disse ao abade zen:


“Gostaria de entrar para o mosteiro, mas nada do que aprendi tem importância. Tudo o que meu pai me ensinou foi jogar xadrez, o que não serve para atingir a iluminação”.


O abade pediu um tabuleiro, chamou um monge, e mandou-o jogar com o rapaz, acrescentando:


“Quem perder, morrerá”.


O rapaz sentiu que lutava por sua vida e o tabuleiro tornou-se o centro do mundo. Entretanto, como sabia todas as estratégias, logo viu que o monge seria derrotado. Preparava-se para o golpe final, quando notou o olhar de santidade do seu adversário. Começou a jogar errado de propósito; preferia morrer, pois o monge podia ser mais útil à humanidade.


De repente, o abade jogou o tabuleiro no chão.


“Você aprendeu mais do que lhe ensinaram”, disse. “Sabe que o caminho para a luz não é feito apenas de concentração, mas também de compaixão. Aceito-o como meu discípulo”.


O caminho do poeta


Em apenas três linhas, no final de um dos mais belos poemas da literatura universal, Robert Frost resume a condição humana:


“Diante de mim estavam dois caminhos;


Eu escolhi o que era menos utilizado


E isso fez toda a diferença”.


 


 


O Globo (Rio de Janeiro) 15/05/2005

O Globo (Rio de Janeiro), 15/05/2005