Xenofobia, ou o medo compulsivo do estrangeiro é uma das sete palavras que considero relevantes para o momento atual. Pedi aos meus leitores que escrevessem a respeito. Para uma visão completa dos comentários: www.paulocoelhoblog.com > Discuss.
Ruth: a vida significa aventura, mudança, coisas que nem todo mundo tem coragem de encarar e aceitar. Quando se olha o estrangeiro, um medo subconsciente vem à tona: “por que ele ousou dar passos e arriscar-se em lugares onde ninguém o conhece? Será que ele quer infiltrar suas idéias, destruir o mundo que construímos com tanto esforço?”
Debbie: penso que a xenofobia está ligada a uma condição normal da espécie humana. Estrangeiros eram sempre vistos como uma ameaça à tribo, ou mais uma boca a alimentar. Ainda não nos desenvolvemos o suficiente para libertar-nos de tantas outras que estão enraizadas em nosso cérebro. Embora estejamos em pleno século XXI, ainda nos vemos em tribos, lutando para sobreviver.
D.H.: durante alguns meses, em 2001, tive aqui em casa(Boston) um estudante árabe. Todos admiravam sua gentileza, e muitas noites nos reuníamos em um bar perto de casa para conversarmos sobre os costumes em seu país. Logo depois dos atentados de 11 de Setembro, as mesmas pessoas que no dia anterior riam com suas histórias, passaram a odiá-lo.
Dasha: a xenofobia não se resume ao medo do estrangeiro, mas também ao que acontece entre diferentes gerações. A maior parte das pessoas teme o dia de hoje, e prefere viver no passado. Meu país (Rússia) é um excelente exemplo a respeito.
Aspen: cada criança, se criada com o rigor e a liberdade necessária, podia colaborar infinitamente para fazer deste planeta um lugar melhor para viver. Entretanto, uma das primeiras coisas que aprendemos é “não conversar com estranhos”.
Guerreiro da Água Corrente: aqui na Dinamarca, temos um festival que dura aproximadamente uma semana, e que atrai cerca de 100 mil estrangeiros para celebrar a vida, os interesses em comuns, e aprender com as diferenças. As pessoas se abraçam sem nenhuma razão além de estarem no mesmo caminho, cantam e se embriagam juntas. Quando o festival termina, uma estranha atmosfera volta a descer sobre o local, e o estrangeiro volta a ser uma ameaça.
Neel P.: precisamos confiar no amor. Precisamos lembrar o que nos foi dito: “amai ao teu próximo como a ti mesmo”. Se confiarmos no amor, não precisamos temer mais nada, mas na verdade jamais confiamos o suficiente...
Radek: as pessoas em meu país (Polônia} passaram pela tirania de Hitler, pela opressão soviética, e parece que não aprenderam nada. Me aterroriza ver gente que experimentou os horrores do nazismo, se comportando da mesma maneira hoje, evitando tudo que seja desconhecido ou diferente. O pior de tudo é que usam a religião para justificarem seus atos, argumentando que todo aquele que não é cristão deve ser banido do meio da sociedade. Esta fé cega é pior que a ausência de fé.
Paulo Coelho: Vamos imaginar uma lagarta. Passa parte de sua vida no chão, achando que Deus foi injusto com ela, por lhe dar uma forma tão repulsiva. Termina odiando as borboletas, que são amadas por todos. Até que um dia a natureza a obriga a tecer um casulo, e ela tem certeza que está construindo seu próprio túmulo. Embora indignada com a vida que levou até então, reclama novamente com Deus: “quando finalmente me acostumei com minha vida, o Senhor me tira o pouco que tenho". Desesperada, tranca-se no casulo e aguarda o fim. Alguns dias depois, vê-se transformada numa linda borboleta. O que antes era o estrangeiro, agora é a manifestação de sua própria beleza.
Revista O Globo (RJ) 16/9/2007