Com o fim do auxílio emergencial, cuja última parcela começou a ser paga ontem, poderemos ter uma noção mais clara do fenômeno de popularidade do presidente Jair Bolsonaro, que já chegou a um índice de 40% em setembro, e caiu este mês para 35%, sempre segundo o Ibope. Teremos, além da geração “nem, nem” - nem estuda, nem trabalha - teremos os “sem, sem”- sem emprego e sem auxílio.
Entre os cidadãos mais pobres o auxílio emergencial mostrou-se resiliente, com a aprovação dos eleitores com renda familiar até um salário mínimo subindo de 19%, em dezembro de 2019, para 35% na pesquisa de setembro, o que levou seu índice de avaliação positiva para 40% naquela ocasião. Os eleitores com menor grau de instrução deram um aumento consistente da popularidade do presidente.
Entre os com até a oitava série do ensino fundamental, a avaliação de ótimo ou bom foi de 25% para 44%, enquanto entre os pesquisados com até a quarta série cursada a aprovação subiu de 26% para 40%. Esses índices, porém, caíram nos últimos três meses, justamente quando o auxílio foi reduzido.
O fim das medidas extraordinárias que o governo decretou para combater a pandemia da COVID-19, que levaram o déficit do país a se elevar para cerca de R$ 700 bilhões, terá um impacto político presumivelmente grande para o presidente Bolsonaro, com consequências sociais graves. Já temos 14 milhões de desempregados, com mais os cerca de 40 milhões que deixarão de receber o auxílio, teremos em janeiro uma situação social muito delicada no país. Os inscritos no Bolsa Família continuarão a receber o beneficio, que não será aumentado como chegou a anunciar o governo.
Com a economia que não sai do lugar, e a inflação aumentando, chegamos a uma combinação que pode ser explosiva. O problema é maior porque o governo está quebrado, não tem condições de manter o equilíbrio fiscal e voltar a pagar o auxílio emergencial, sem romper o teto de gastos. Depois que os governadores pressionaram o governo para que estendesse o auxílio emergencial por mais tempo, enquanto a pandemia persistir, a equipe econômica soltou uma nota ontem afirmando que não haverá prorrogação.
A pandemia não acaba, aumenta o número de mortes e de infectados, e o governo está atrasadíssimo com a vacinação. Ainda não entendeu que a vacinação massiva da população é que dará condição à economia de retomar um patamar de crescimento. Seria injusto dizer que o ministro da Economia Paulo Guedes não entendeu essa equação simples, mas ele já não tem o poder de decisão que presumia ter no inicio do governo.
Resta-lhe gastar a oratória farta para fora do governo, tentando criar situações favoráveis a seus pontos de vista. A nota oficial de ontem foi um exemplo dessa tentativa de barrar os governadores antes que eles convencessem o presidente a estender o auxilio emergencial.
Não quer dizer que Bolsonaro não possa mudar de ideia a qualquer momento, se farejar que os índices de popularidade cairão mais ainda a partir de janeiro. Enquanto não pode usar o Tesouro a seu favor, o presidente tenta tergiversar, provocando polêmicas que desviem a atenção de seus fracassos, o maior deles a vacinação que já teve início em vários países vizinhos, até mesmo na Argentina, aqui do lado.
Quando se referiu ironicamente à tortura sofrida pela ex-presidente Dilma, pedindo um exame que prove as sequelas, Bolsonaro nada mais faz do que incensar seus apoiadores mais exaltados, mantendo aberta a porta da radicalização que já foi seu apoio político nos tempos em que pretendia dar um auto-golpe. Até jogar futebol, com direito a transmissão pela televisão estatal, Bolsonaro fez.
Quando diz que votaria até em Lula, mas nunca em João Doria, está ao mesmo tempo revelando o desejo in pectore de tê-lo como candidato, mas também deixa transparecer que seu verdadeiro adversário até o momento é Dória ou Moro, que também vem sendo atacado pelo ministro da Justiça mais submisso dos últimos tempos.