Jornal aqui do Rio publica foto do local onde vivia um dos traficantes mais procurados pela polícia carioca, um tal de Sassá, 34 anos, que lidera o tráfico em 11 favelas, responsável pela maioria dos confrontos que provocaram interdições nas linhas Vermelha e Amarela.
Ao ser preso, na semana passada, ofereceu um milhão de reais aos guardas que o jogaram no camburão. Não levava o dinheiro na cueca, mas o pagamento seria "cash", era só apanhar num balde de plástico azul sob a pia do banheiro de seu esconderijo permanente.
O que me impressionou, na foto, foi a desoladora pobreza, quase miséria, do quarto onde o bandido morava. A pequena geladeira, cuja porta ficou aberta na hora da prisão, mostrava alguns iogurtes, duas latas de refrigerantes "light", um vidro que parece ser de geléia, pela metade, três latas de leite condensado, pouco mais do que isso.
O bandido dormia num sofá de dois lugares, bem cafona, com estampados conflitantes. Numa prateleira acima da geladeira, pacotes de biscoito. Uma TV no chão, com o controle remoto em cima do sofá, e um ventilador ordinário, de 12 polegadas, que continuou funcionando no vazio -num filme de Antonioni há um ventilador igual que fica ventando em cima de Mônica Vitti o tempo todo.
Não há armas na fotografia. Certamente os policiais as levaram. Deviam ser mais suntuosas do que os trecos ali deixados, coisas de última geração. Movimentando o tráfico de 11 favelas, tendo um milhão de reais num balde sob a pia, Sassá era um anacoreta.
Uns pelos outros, os chefes que movimentam o tráfico vivem em cubículos iguais ou piores. Evitam os sinais exteriores de riqueza -é a explicação que geralmente é dada. Mandam folhear de ouro as armas, mas se alimentam de iogurte e leite condensado. Saudavelmente corretos, devem estranhar o grude que lhes é servido na prisão, geralmente temporária. Deve haver baldes azuis em outros lugares.
Folha de São Paulo (São Paulo) 08/11/2005