Mais uma vez, o mundo se curvará diante do Brasil. O mundo é Paris, onde teremos um salão dedicado ao Brasil. Governo e particulares já estão se preparando para o evento, quando se realizarão shows, mostras e palestras da efervescente cultura nacional.
Qualquer cidadão, em gozo de relativa ou total lucidez, sente-se obrigado a dar força ao Salão, que, entre mortos e feridos, sempre colocará o Brasil sob um foco favorável, que geralmente nos falta. Não vem ao caso discutir se a programação, a oficial e a particular, é adequada e eficiente.
O problema é saber em que medida o mundo e, em particular, a capital da França estão realmente interessados em conhecer nossa produção artística e cultural. Em geral, há um superdimensionamento de nossa parte e uma esquálida retribuição dos nossos esforços.
Em março de 1998, o Brasil foi o homenageado no Salão do Livro de Paris. A convite do governo francês, integrei nossa representação. Fiz e ouvi conferências, como outros intelectuais franceses e brasileiros. Era farta a nossa delegação.
Como todos os demais, dei duas ou três entrevistas à imprensa local. Em duas delas, queriam saber se o Brasil seria campeão do mundo naquele ano -a Copa seria em junho. A outra quis saber o que eu pensava de Zidane, o jogador que afinal nos derrotou na final daquele torneio. Eu nunca ouvira falar em Zidane, que só estourou mundialmente após a Copa da França.
Teve um mérito o Salão do Livro de 98. Recebi, como outros receberam, uma comenda de Cavalheiro da Ordem das Artes e das Letras. O mérito não está na minha comenda, mas no pasmo que provoquei no Luís Fernando Veríssimo, que, ao tomar o metrô, esbarrou comigo, encolhido num canto. Veríssimo imaginava que um Cavalheiro da França teria um séqüito, fanfarras, flâmulas. Até hoje não se recuperou da decepção causada pela glória francesa e pela minha própria glória.
Folha de São Paulo (São Paulo) 15/01/2005