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Rio - Bagdá

 

O governo dos Estados Unidos, preocupado com a saúde e o bem-estar de suas autoridades e de seus cidadãos em geral, na semana passada iniciou uma campanha humanitária aconselhando os norte-americanos a evitarem o Rio de Janeiro, onde a segurança é problemática. Para consolidar os bons propósitos, divulga cenas do último arrastão no Leblon e publica estatísticas e depoimentos de estrangeiros que aqui sofreram algum tipo de violência ou constrangimento.


O Rio é descrito como uma terra de carnificina. Aqui a vida nada vale, à mercê de balas perdidas e de assaltos radicalmente explícitos. Exageros à parte, não faltam razões para o aviso preventivo.


No pólo oposto, Bagdá, capital do Iraque, onde as balas não são perdidas, pois todas têm endereço certo e sabido, continua atraindo jovens norte-americanos que para lá se dirigem por conta do Pentágono e do Tesouro dos Estados Unidos. Mais idealistas do que sibaritas em busca de prazer, esses jovens vão para Bagdá com um destino patriótico: matar ou morrer exercendo um tipo de turismo especial, que já teve antecedentes ilustres no Vietnã e em outras paragens.


Sempre admirei a clarividência e o fervor da turma de lá em proteger seus interesses, não apenas em seus bens morais e econômicos, mas no bem maior que é o elemento humano, o norte-americano em cabeça, tronco e membros, não exatamente o elemento humano dos outros. O ideal para os EUA seria que todos os norte-americanos passeassem pelo mundo como se estivessem em casa, protegidos pelo FBI, dando uma banana para as leis e autoridades locais.


Para conseguir isso, invadem ou ameaçam invadir países em que esse direito é contestado. Bem, o Rio atravessa uma fase difícil em termos de segurança. Se o Brasil está mesmo a caminho de fabricar uma arma nuclear, breve teremos a segurança que foi imposta a Bagdá.


 


Folha de São Paulo (São Paulo) 10/11/2004

Folha de São Paulo (São Paulo), 10/11/2004