Como aqueles arruaceiros de rua que vivem atrás de pretexto para uma briga, o presidente Bolsonaro não passa um dia sem atacar o Supremo Tribunal Federal (STF) e seus ministros. E também afronta a Câmara, que se prepara para vetar a proposta de voto impresso na Comissão Especial montada para estudar o assunto.
Não é preciso ser adivinho para saber que, ao agir com tamanha imprudência, Bolsonaro quer apenas um pretexto para tentar arranjar uma grande confusão no país, diante da possibilidade de perder a eleição presidencial do ano que vem.
A resposta dura do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ao abrir inquérito administrativo sobre as ameaças de Bolsonaro à realização de eleições do ano que vem, com seus ataques à urna eletrônica, mostra que suas bravatas estão prestes a se ver às voltas com a Justiça.
Não há evidências de que os bolsonaristas que saíram às ruas no domingo a favor do voto impresso sejam a maioria do eleitorado, como diz o presidente. Nem que Bolsonaro tenha condições de levar as Forças Armadas a apoiar um golpe militar, muito menos por um motivo tão fútil.
O descrédito a que as Forças Armadas foram submetidas diante dos arroubos autoritários de Bolsonaro parece ter levado os militares a repensar esse apoio irrestrito, mesmo que o ministro da Defesa, Braga Netto, pareça infenso ao desgaste. Agora que se entregou ao Centrão, assumindo-se como um de seus membros desde o início de sua carreira política, Bolsonaro não deixou apenas seus seguidores mais radicais de queixo caído, mas também os militares que acreditavam na sua capacidade de lidar com políticos sem se entregar às negociações promíscuas.
Pegue-se o exemplo do sumido general Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). Como estará se sentindo diante da desmoralização que sofreu com seu grande líder não apenas chamando para dentro do governo o grupo político corrupto que atacava, como dizendo-se ele próprio membro do Centrão?
De qualquer maneira, o que já não seria provável de acontecer, hoje parece uma quimera distante de um golpista inveterado que desde os tempos dos quartéis se acostumou a reivindicar à base de violência e terrorismo. Daí para a busca de um pretexto para tumultuar o panorama político, é um pulo para quem é considerado “incontrolável” pelos próprios companheiros de farda.
Dizer que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso está defendendo a urna eletrônica para favorecer o ex-presidente Lula é simplesmente não conhecer o histórico dos votos do atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No mais recente sobre o assunto, quando o plenário do STF manteve a decisão do relator, ministro Edson Fachin, de anular o processo do triplex do Guarujá julgado na Vara de Curitiba, Barroso seguiu o relator, mas ressalvou que sempre votou pela competência da Vara presidida pelo então juiz Sergio Moro e que se curvava à maioria já estabelecida.
Mesmo assim, fez questão de anotar que considerava que a anulação não se estenderia automaticamente aos demais processos, o que acabou não se concretizando porque o ministro Gilmar Mendes a estendeu a todos os julgamentos de Moro contra Lula. Em vários outros julgamentos, Barroso votou a favor da Lava-Jato e de Moro e pela prisão de Lula quando condenado em segunda instância.
Ontem, Bolsonaro voltou a criticar Barroso, afirmando que ele só foi nomeado para o STF pela presidente Dilma porque defendeu o terrorista italiano Cesare Battisti, caso que interessava ao PT. Recebeu duras respostas na volta do recesso do Judiciário. O presidente do Supremo, ministro Luiz Fux, lembrou que independência de Poderes não significa impunidade. Também Barroso, presidente do TSE, criticou Bolsonaro indiretamente ao falar sobre os perigos “do populismo, extremismo e autoritarismo”. Segundo Barroso, depois de eleitos, esses líderes “vão desconstruindo, tijolo por tijolo, os pilares da democracia, concentrando poderes no Executivo, procurando demonizar a imprensa, procurando colonizar os tribunais constitucionais que atuam com independência”.
Mais uma vez, Bolsonaro joga com o antipetismo para tentar se colocar como o único capaz de derrotar Lula na eleição do ano que vem. Diante da calamidade que é seu governo, não creio que essa farsa volte a funcionar. Mais fácil os eleitores desgostosos tentarem encontrar uma alternativa aos dois.