Durante os oito anos do governo de Fernando Henrique Cardoso, dia sim, dia não, eu o criticava, às vezes com aspereza, neste mesmo canto da página A2. Muitos leitores me consideravam um petista radical, esquecidos que com a mesma pontualidade, dia sim, dia não, eu criticava o PT e, de certa forma, outros partidos com a mesma violência.
Uma editora ligada ao partido de Lula reuniu algumas crônicas e publicou-as com o reforço das charges do nosso Angeli: "O Presidente Que Sabia Javanês", título chupado de um dos maiores escritores da nossa literatura: Lima Barreto.
Passa o tempo, e FHC é eleito para a Academia Brasileira de Letras (ABL). Sem receber qualquer pressão, votei nele. Se ele fosse candidato a síndico do prédio em que moro, certamente daria meu voto a outro, fosse quem fosse.
Acontece que FHC é um intelectual brilhante. No pouco tempo em que frequenta a ABL, pelo menos fez duas palestras que mereciam ser ouvidas de joelhos. Uma delas sobre Joaquim Nabuco, e outra, mais recentemente, na semana passada, sobre a necessidade de reinventar a democracia.
Com deslavada frequência, venho declarando que sou contra a democracia em sua versão representativa. E como não tenho uma alternativa, recusando-me a aceitar a ditadura ou qualquer outra forma de totalitarismo (fui preso seis vezes pela ditadura mais recente) sempre faço um apelo para que a classe política, formada por alguns homens de valor, encontrem uma saída, ou melhor, que reinventem a democracia, tornando-a realmente democrática, deixando de ser a fonte principal da corrupção em todos os seus níveis.
FHC explicitou de forma excepcional a necessidade de reinventar a democracia, livrando-a da prioridade eleitoreira, mãe das aberrações que conhecemos e lamentamos.