O visual não chega a ser agradável, agravado pelas fotos com que a imprensa, sobretudo a semanal, se esmera em apresentá-lo como um cangaceiro. Além disso, Severino é criticado pela mídia como representante de um Brasil retrógrado, fora do esquadro de um país que se julga moderno mas tem a pior distribuição de renda, os juros mais altos do mundo e outras misérias -não por culpa dele, mas por conta dos grupos que detêm o poder e se acreditam vestais, transparentes como os anjos.
Creio que ele se saiu bem na entrevista concedida ontem. Bem verdade que ajudado por algumas perguntas asnáticas que lhe fizeram e que deram a ele a oportunidade de repetir diversas vezes: "Eu cumprirei o meu dever. Eles que cumpram o dever deles".
No fundo, tudo se resume na banalidade dessa frase. A gula pelo poder na Câmara, a pretexto de uma denúncia ainda não comprovada, assanhou vários pretendentes que repetem, em escala maior, o contexto que elegeu Severino. A insistência de Zé Dirceu em apoiar um candidato e o racha dentro do PT apoiando outro candidato deu no que deu.
Dentro da regra do jogo, o mandato de Severino é límpido. A denúncia contra ele é grave mas tem contradições, como a Folha registrou na edição de ontem. Mesmo assim, uma vez comprovada, cabe à Câmara enquadrá-lo dentro da regra do jogo, cassar seu mandato de presidente e de deputado após a Comissão de Ética encaminhar o pedido ao plenário. Evidente, dando ao acusado o direito do contraditório.
Qualquer solução que não seja a legal será um golpe, ainda que apoiado pela maioria da mídia, a mesma que apoiou outros golpes no passado, como o de 1964 (o arrependimento só veio mais tarde). A ameaça de alguns líderes de se retirarem do plenário, recusando-se à presidência de Severino, é prevista no regimento da Câmara: por falta de quorum, a sessão seria suspensa. Indefinidamente enquanto durar o impasse. Ganhará o mais teimoso.
Folha de São Paulo (São Paulo) 12/09/2005