RIO DE JANEIRO - No Brasil e no mundo, é um lugar-comum as autoridades constituídas declararem que "não negociam com criminosos". Vão às últimas conseqüências, preferem bancar para ver se o adversário está blefando -e geralmente não está.
Tivemos um caso desses durante a ditadura militar. Um grupo de adversários do regime seqüestrou o embaixador dos EUA. Como da tradição dos seqüestros, fez exigências que incluíam a libertação de alguns presos políticos e a leitura de manifestos condenando o arbítrio e a prática de atos totalitários. O governo da época achou mais prudente aceitar o preço do resgate -o que não impediu, pelo contrário, aumentou o grau da repressão.
Na vida pessoal dos cidadãos, muitos casos de seqüestros são negociados pelas famílias das vítimas, que discutem o preço do resgate e acabam não apenas pagando a quantia combinada mas evitam colocar a polícia na jogada -exigência obrigatória dos seqüestradores.
O tema é polêmico. Mas desde que se reconheça um estado de guerra entre a lei e o crime (político ou policial), ficam valendo as práticas tradicionais entre os dois beligerantes. O acordo, a trégua, o toma lá dá cá costumam ser uma regra seguida desde os tempos de Alexandre e de César.
É evidente que a negociação fortalece, em princípio, o inimigo. Mas a própria negociação revela não apenas a força do adversário mas a firmeza de suas convicções -que podem fornecer elementos novos para combatê-lo.
Não vem ao caso discutir se as Farc são um bando de criminosos financiados por traficantes. Em outros tempos, seriam financiados pelo ouro de Moscou ou da China, com a mesma finalidade de contestar e, se possível, derrubar um governo comprometido com a política dos Estados Unidos.
Folha de S. Paulo (SP) 17/1/2008