O Congresso Nacional resolveu, em boa hora, reduzir o número de vereadores, que entopem as Câmaras Municipais do interior do país. Geralmente, os vereadores reúnem-se uma vez por semana, à noite, pois todos têm trabalho durante o dia, nos seus negócios particulares. No fim do mês, porém, lá vem o salário, várias vezes superior ao mercado local e, o que é pior, várias vezes o mercado nacional. Não trabalham. São boas vidas. Vão à Câmara para conversar, pois o que têm de fazer é pouquíssimo, com exceção de algumas grandes cidades, a maioria delas não chega a alguns milhares de habitantes, sem problemas outros que os locais, como água, esgoto, circulação. Os deputados quiseram aumentar o colégio eleitoral de que dispõem, à custa do erário público, e criaram os municípios.
Passados mais de catorze anos da vigência da nova Constituição, a Constituição dos miseráveis de que falava o deputado Ulysses Guimarães, de saudosa memória, verificou-se que os vereadores eram demasiado numerosos e deveriam ser cortados. Chegou agora o momento de fazer o corte. Muito bem. O corte foi feito, com o fim de diminuir o peso dos salários da vereança na folha de pagamento do município, no qual, em geral, falta tudo ou quase tudo, enquanto o povo padece a incúria dos seus legisladores. Vem daí a decisão de decepar o número de vereadores, sem piedade, pois não fazem falta nenhuma aos municípios, que podem funcionar com dois ou três vereadores, no máximo. Corte foi feito.
Mas, os deputados e senadores não contavam com a imaginação e a ambição dos vereadores. O corte prejudicou apenas os vereadores que perderam o lugar e não têm mais onde prosear à noite, no dia da sessão e o salário no fim do mês, para a manutenção da casa, quando seus assistidos legalmente pela Câmara passam mal, por ganharem pouco e, em geral, arrumam seus trens para procurar emprego nas cidades maiores, como tem acontecido mesmo sem o corte, e com o corte, haverá mais mudanças, vindo de algumas cidadezinhas.
Algumas verdadeiras aldeias a ficar sem ninguém, nem mesmo para dizer bom dia ao prefeito ou ao amigo que supostamente deveria encontrar na rua. Desaparecerão as cidades pequenas, ficando só as grandes, sem, no entanto, emprego para oferecer aos necessitados. É no que dá estabelecerem salários sem um plano para manutenção de um certo número de vereadores, obrigatoriamente fixados num número imutável, com salário também imutável. Mas, assim mesmo, os vereadores que ficarem arranjarão um meio de nada perder do que ganham. Enfim, o corte foi feito. Veremos o resultado no futuro que começa para os municípios.
Diário do Comércio (São Paulo - SP) 07/07/2004