Numa aula magna na Universidade Cândido Mendes, o príncipe Talal, da Jordânia, fez inteligentes comentários sobre as diversas crises políticas e militares que inquietam o nosso tempo. A observação que mais me impressionou foi a de que os grandes deste mundo -reis, presidentes, chefes de governo e de Estado - dificilmente se recusam a sentar à mesma mesa dos adversários.
Pelo contrário. Procuram-se com freqüência até exagerada, abraçam-se, trocam presentes, dão tapinhas nas costas uns dos outros. Geralmente assinam protocolos de intenção, em alguns casos chegam a se beijar na face, de acordo com a tradição de cada país.
Tudo a portas fechadas. Abertas as portas, prestadas as últimas filigranas dos protocolos, é cada um por si, o que equivale dizer que não apenas é mantido o status quo das desavenças mas a convicção que cada um leva: deve prevalecer a lei da selva.
A observação do príncipe da Jordânia aplica-se aos dias atuais, mas não chega a ser uma novidade. Em escala maior, universal, tivemos a falência da Liga das Nações, que não impediu conflitos mundiais e setorizados, e, mais recentemente, a ONU, para dar apenas um exemplo, que não conseguiu impedir a invasão do Iraque.
Toda vez que eu vejo dois chefes de Estado reunidos, fico pensando na dose de hipocrisia que cada qual leva consigo. A conclusão a que se pode chegar, diante das contradições do que se combina da porta para dentro e do que se faz da porta para fora, é que a representatividade dos dirigentes não é lá essas coisas. Em tese, são chefes que assumiram o poder legalmente, mas não representam a vontade e os interesses dos seus Estados e de seu povo.
Contudo temos hoje uma exceção macabra. Ao contrário dos tempos de Arafat, que fazia acordos que o povo palestino não aceitava, as lideranças atuais da Autoridade Palestina parecem mais sintonizadas com a maioria radical que elegeu o novo governo. Repito: uma exceção macabra, que fará cada vez mais um número maior de vítimas de ambos os lados.
Folha de S. Paulo (São Paulo) 23/04/2006