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Perdendo a alma do Brasil

 

A proteção de bens imateriais, ou seja, aqueles que não são físicos, como prédios e esculturas, tem sido defendida há muitos anos no Brasil e atende à preocupação de entidades internacionais que têm se dedicado com afinco ao tema. A Unesco, por exemplo, através de sua " Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial ", de 17 de outubro de 2003, considera incluídas nesta categoria as "práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante do seu patrimônio cultural".


Em 1936, quando produzia, a pedido de Gustavo Capanema, o texto do anteprojeto que criaria o então Serviço de Proteção do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), o escritor Mário de Andrade já falava da importância de se preservar as manifestações culturais. Por essa iniciativa, ele é considerado um dos precursores do tema no país.


Com base no preceito constitucional, algumas manifestações não-materiais já estariam devidamente protegidas. Mas, na verdade, falta a regulamentação, para que se saiba realmente o que deve ser amparado.


Em 1996, em função das comemorações dos 500 anos do Descobrimento do Brasil, foi criado, através de decreto, o Museu Aberto do Descobrimento, no Monte Pascoal, na Bahia, o primeiro local avistado pela fragata de Pedro Álvares Cabral. O decreto assinado em 22 de abril de 1996 era ambicioso: rios, povos indígenas e paisagens fariam a composição de um espaço que abrigaria toda a costa do descobrimento, uma área de 1,2 mil quilômetros quadrados. A idéia não vingou.


O presidente Fernando Henrique Cardoso assinou o decreto 3.551, instituindo a proteção legal para patrimônios não-materiais, que seriam os elementos do nosso folclore, as festas, as danças e as diversas manifestações culturais e religiosas. Pelo decreto, o bem não seria propriamente tombado, mas sim registrado em quatro livros diferentes: dos Saberes, de Celebrações, das Formas de Expressão e de Lugares.


O tema esteve em pauta recentemente através do artigo publicado do acadêmico José Sarney "Lampião e o Iphan". O ex-presidente da República lembrou que o Iphan tem apenas quatro funcionários para cuidar dos registros de bens imateriais. E o pior: a entidade encontra-se há 20 anos sem concurso público. Já é hora, pois, de pensar seriamente no assunto.


Temos alguns exemplos de bens imateriais: a pintura corporal dos índios Wajãpi (Amapá), o trabalho das paneleiras de Goiabeiras (Espírito Santo) e o ministro Gilberto Gil sugeriu o tombamento do samba como Patrimônio Cultural da Humanidade. O caminho é longo.




Diário do Comércio (São Paulo) 30/09/2005

Diário do Comércio (São Paulo), 30/09/2005