O excesso de provas anda prejudicando a efetividade de nosso sistema judicial. Já aconteceu antes no julgamento da chapa Dilma/Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), está acontecendo agora na Câmara em relação ao processo apresentado pelo Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, contra o presidente Temer.
Nesse caso, temos não apenas as delações dos executivos da JBS, mas, também, a gravação do próprio presidente combinando, de viva voz, encontros clandestinos “sempre pela garagem, viu”, manobras escusas para garantir o silêncio de um preso ("O Eduardo também"?) e a indicação de um intermediário, o ex-assessor Rodrigo Rocha Loures (“Pode passar por meio dele, viu?”). Passar o que, cara-pálida?
Dias depois, aparece o mesmo Rodrigo, “da minha mais estrita confiança” segundo Temer, correndo apressado com uma mala pelas ruas de São Paulo, mala que, devolvida depois que soube que havia sido filmado pela Polícia Federal, continha R$ 500 mil, primeira parcela de muitas, negociação que a Polícia também gravou para que a JBS pudesse comprar diretamente gás da Bolívia para uma termelétrica cujo fornecimento era exclusivo da Petrobras.
Propina para 20 anos, parcelada em prestações semanais. (“Passar por meio dele”).
As negociações de Rocha Loures com o principal assessor de Joesley, Ricardo Saud, foram acompanhadas pela Polícia Federal, e há até rascunhos apreendidos com contas a respeito do preço do gás e o lucro ou prejuízo que a JBS teria nas operações. Agoraa defesa de Temer adota a mesma tática da de Lula, ataca os acusadores, que é o caminho mais fácil.
Mas são desculpas esfarrapadas, sem sentido. Depois da perícia na fita da conversa com Joesley, que mostrou novos diálogos, a situação do presidente Temer é muito difícil. E só não é pior porque a Câmara vai decidir se aceita a denúncia contra ele na base do interesse político próprio, não da sociedade, nem diante das provas.
Vamos ter que esperar para ver como as coisas vão se deteriorar até o dia da votação. No momento, aparentemente o presidente Temer consegue se livrar da denúncia, mas daqui a 15 dias, um mês, ninguém sabe o que vai acontecer. Os políticos devem estar fazendo as contas para tentar saber se é mais seguro manter um presidente impopular, mas amigo, ou se é possível tentar uma nova escolha – provavelmente Rodrigo Maia – e se isso vai melhorar a proteção deles diante da Lava-Jato e da sociedade.
O presidente Temer foi à televisão para dizer que a denúncia está baseada em “ilações”. O mesmo diz uma ampla nota doInstituto Teotônio Vilela, do PSDB, que afirma que, por enquanto, não há provas inequívocas de que houve corrupção, embora possa ter havido. Mas a base da argumentação não tem nada a ver com provas, com ética, com valores.
Tem a ver com uma presumida estabilidade de governo, pois, segundo o PSDB, “o País não tem nada a ganhar com a queda de Temer”. As provas abundantes, com vídeos e fotos, já por si seriam suficientes. Mas os novos diálogos surgidos da perícia no áudio são mais do que reveladores.
Quando o empresário Joesley Batista diz que zerou as pendências, aparece pela primeira vez Temer dizendo "tudo". Antes de dizer a famosa frase onde tudo começou (“tem de manter isso, viu?”), Temer diz: "muito bem", para comemorar o relato de que tudo estava acertado, de que estava bem com o Eduardo (Cunha). E pela primeira vez surge a voz de Temer perguntando, quando Joesley relata que todo mês está dando um dinheiro para manter o doleiro Funaro calado na prisão: "O Eduardo também"?, o que o interlocutor confirma.
Depois, tem Temer falando sobre os juízes, que Joesley diz que está controlando: "essa situação é perigosíssima", como que ensinando. E aparece pela primeira vez Temer dando o nome de "Rodrigo" como o interlocutor da mais estrita confiança. Antes sabíamos que era o Rodrigo apenas pela pergunta do Joesley: "É o Rodrigo"?
Para fechar a conversa,em um trecho do áudio da conversa entre Michel Temer e Joesley Batista periciado pela Polícia Federal, o presidente recomenda ao executivo da JBS que sempre entre pela garagem do Palácio do Jaburu.
Temer: “Pela garagem.”
Joesley: “{Pela} garagem.”
Temer: “(lninteligivel) sempre pela garagem, viu?”
Joesley: “Funcionou super bem, à noite …”
Temer: “É.”
Joesley: “… onze hora da noite, meia-noite, dé … dez e meia, vem aqui.”
Temer: “(Ininteligível). Não tem imprensa.”
Joesley: “A gente conversa uns dez minutinho, uma meia horinha, vou embora.”
Não é preciso muita ilação para entender o que se passava naquela noite nos porões do Palácio do Jaburu que suscitou o processo da Procuradoria-Geral da República.