Quando fui ver “Minha mãe é uma peça 3”, não fui com muito entusiasmo. Apesar de cumprir um papel importante na aproximação do público com o filme brasileiro, os dois primeiros filmes da série haviam me dividido entre o que chamávamos de neo-chanchada, um gênero vazio que tentava fazer explodir o nada, e a descoberta de um comediante original, cheio de energia, com uma capacidade de improvisação que detonava o cotidiano e nos fazia rir com isso. Alguma coisa entre Zé Trindade e Chico Anysio.
O terceiro filme da série me pegou desde sua abertura. Embora ali não houvesse piada para fazer rir desbragadamente, havia alguma coisa doce e carinhosa naquele passeio de dona Hermínia pela feira, onde havia se acostumado a comprar mamões e bananas para equilibrar seu movimento intestinal e a vontade de ir ao banheiro. Eu estava descobrindo que Paulo Gustavo não era um cômico vulgar, não estava interessado em fazer rir de trapalhadas físicas e convencionais. Ele não pretendia nos conquistar pela dificuldade de usar seu corpo ou sua inteligência, como um Três Patetas desses, mas em nos revelar dificuldades comuns a todos nós, às nossas cultura e organização social. E rir delas sem subestimar a importância de vencê-las.
É difícil resumir o papel de um criador como Paulo Gustavo nisso tudo. Não sei se ele tinha consciência do destaque social e cultural do que fazia. Nem precisava ter. O maior comediante da história do cinema, Charles Chaplin, aquele que inventou a comédia de costumes no silêncio de seus filmes, que inventou o riso como arma de conhecimento do outro e consciência de todos, devia saber do que o cinema era capaz e, no entanto, fez sua obra como quem vai ali e já volta. E esse “ali” era o próprio mundo em torno dele e a vida que ele cantava, mesmo que com acidez, através de seus personagens, fossem eles heróis ou vilões.
Não o conheci pessoalmente. Mas, conhecendo sua obra, era como se tivesse sido íntimo dele, pela força de seu interesse pelos outros e pela própria vida. E, no entanto, a morte de Paulo Gustavo, não esqueçamos, foi mais um crime de descaso, cometido pelos que não se importam que a Covid 19 liquide com cerca de 450 mil brasileiros. Infelizmente, Paulo Gustavo foi um deles.