Os paradoxos continuam dominando a política brasileira, liderada desde o impeachment da ex-presidente Dilma por uma figura paradoxal como Michel Temer, que detectou na impopularidade a alavanca para agir como estadista no que toca às reformas estruturais do país, mas, ao mesmo tempo protege, como bom comandante à moda antiga, um grupo acusado por todos os lados de fisiologismo político.
E, mais paradoxal ainda, é esse grupo político, mais desmoralizado depois da lista de Janot ser divulgada, que dá a base parlamentar para uma possível aprovação da reforma da Previdência, por exemplo. Uma reforma que político algum gostaria de aprovar em tempos normais, em qualquer país do mundo, mas que no Brasil de hoje encontra espaço justamente pela impopularidade do presidente da República e de sua base política no Congresso.
Quem está contra a reforma da Previdência, como o movimento paredista de ontem demonstrou claramente, são as corporações do serviço público, os militantes sindicais e as classes privilegiadas pela atual situação. São esses setores que têm capacidade de se mobilizar num dia de semana, e mesmo assim deixaram clara a sua característica minoritária no momento.
Não que o governo tenha capacidade para mobilizar massas a seu favor, menos ainda em tema tão polêmico, mas tudo indica que as pressões corporativas não inviabilizarão a votação da reforma, embora ajustes tenham que ser feitos para torná-la um pouco mais palatável, mesmo para quem já está com a popularidade no volume morto.
Esse paradoxo brasileiro foi bem entendido pela agência Moody’s, que alterou a perspectiva do rating brasileiro de negativa para estável, embora continue fora do grau de investimento que já tivemos. Segundo a agência de classificação de risco, a economia brasileira dá sinais de melhora, com inflação em trajetória de queda e melhoria da perspectiva fiscal. De acordo com a Moody's, um momento propício para reforma da Previdência.
Os sinais são de que saímos aos poucos da recessão econômica, mas, mais paradoxos, não há perspectiva política que dê garantias a essa melhoria. Dificilmente sairá deste governo candidato viável para a eleição presidencial de 2018.
O mais óbvio deles, o próprio presidente Michel Temer, tem coisas mais urgentes para enfrentar do que uma fantasiosa candidatura presidencial. Temer corre o risco de ser cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tais são as evidências de que a chapa vencedora em 2014 foi eleita com abuso de poder econômico.
A salvação de Temer é manter a capacidade de comando de uma maioria parlamentar que alimente a possibilidade de aprovar reformas necessárias, e não apenas a da Previdência. As reformas trabalhistas são fundamentais para ajudar a superar o desemprego, e permitir às empresas a retomada do crescimento. A reforma tributária é necessária para melhorar o ambiente de negócios.
Todas, reformas que estão paralisadas desde os primeiros meses do primeiro governo Lula, quando ele decidiu, depois de tentar dar prosseguimento à reforma da Previdência iniciada nos governos de Fernando Henrique Cardoso, paralisá-las para não perder sua base de apoio sindicalista.
Temer vai aproveitando sua impopularidade e a falta de perspectiva política – chegou à presidência pelo atalho da vice quando, anteriormente, mal conseguiu se eleger deputado federal – para marcar sua passagem pela chefia do governo, e paradoxalmente, ensaia ser um estadista que pensa nas próximas gerações, deixando de ser o político populista que só pensa na próxima eleição.
Com o apoio de uma base parlamentar recheada de populistas e fisiológicos que, como seu líder, não tem saída a não ser aprovar as reformas. Paradoxalmente, um Congresso tido como o pior em muitos anos, pode ser o Congresso reformista de que o país necessita.