Passamos duas semanas discutindo se os congressistas devem ter seus vencimentos aumentados. A mídia e a opinião pública estão esculhambando a pretensão, com argumentos mais do que manjados e repetidos à exaustão sempre que o tema entra em debate.
Não fui ouvido nem cheirado sobre a questão, nem por isso deixarei de dar meu palpite. Sou a favor de um brutal, um colossal aumento de vencimentos não apenas dos congressistas, mas de todas as autoridades de alto escalão, que na realidade ganham um salário quase simbólico.
Para compensar o salário que todos admitem ser simbólico, foram criadas dezenas de vantagens que representam, em alguns casos, cinco, seis vezes o valor básico. Sinceramente, não sei como foram criadas as mordomias atuais, acho que com o advento da era Brasília, quando a nova capital exigia algumas compensações.
Lembro que JK, quando foi deputado federal (durante a Constituinte de 1946), morava com a família no Hotel Flórida, que existe até hoje, é um modesto três estrelas, na rua Ferreira Viana, no Catete, bairro mais do que classe média. Não tinha carro para se deslocar até o Palácio Tiradentes, ia trabalhar de ônibus e muitas vezes de bonde.
Não tinha auxílio-moradia, nem franquia postal, nem viagens para consultar suas bases em Minas Gerais, nem um batalhão de assessores, secretários, seguranças e aspones.
Uns pelos outros, de acordo com as posses de cada um, todos viviam modestamente aqui no Rio. Cansei de ver, no bonde Itapiru-Barcas, que passava na Praça 15, onde ficava a Câmara, o deputado Segadas Vianna, que era careca, morava não sei se na Tijuca ou no Rio Comprido, chegou a ser ministro do Trabalho no segundo governo de Vargas.
E havia um deputado, creio que do Espírito Santo, que ia para a Câmara de bicicleta, morava perto, na rua do Riachuelo, ex-Mata-Cavalos, famosa pelos "rendez-vous" ali existentes e pelas reminiscências sentimentais de "Dom Casmurro".
Folha de São Paulo (São Paulo) 13/03/2005