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Os parceiros ocultos

 

Falei com carinho de Rita Lee em duas colunas recentes e, em ambas, atribuí-lhe a autoria de "Mania de Você". Errado. O certo seria chamá-la de coautora, já que, não só nesta, mas em "Caso Sério" e tantos sucessos, Rita teve a parceria de Roberto de Carvalho, compositor, pianista, arranjador e criador da irresistível sonoridade de Rita naquele tempo. Essa omissão é frequente quando um dos autores é a estrela que canta e dá o nome ao disco.

Já aconteceu mil vezes. O poeta Catullo da Paixão Cearense passou à história pelo "Luar do Sertão" (1914), cuja música era um tema folclórico adaptado pelo esquecido violonista João Pernambuco. Noel Rosa e o pianista Vadico foram parceiros em "Feitio de Oração", "Conversa de Botequim" e "Feitiço da Vila". Mas, por Noel ser o gênio único de tantos outros sambas, Vadico nem sempre é citado.

Sem o compositor e letrista cearense Humberto Teixeira, Luiz Gonzaga não teria sido tão Luiz Gonzaga. Os dois criaram juntos seus grandes baiões: Teixeira ao piano, Gonzaga à sanfona e Teixeira também à caneta. Mas quem os levava ao palco e ao disco era Gonzaga.

Para todo mundo, "Disparada", famosa por empatar com "A Banda", de Chico Buarque, num festival em 1966, é "de Geraldo Vandré". Mas Vandré, com suas notórias limitações musicais, nunca poderia ter composto aquela emaranhada moda-de-viola. Seu parceiro, Theo de Barros, completo violonista, sim. Foi o que Theo fez com a letra de Vandré. E quantos de nós, apaixonados por Nelson Cavaquinho, saberemos que aquelas letras de "Folhas Secas", "Quando Eu Me Chamar Saudade", "Pranto de Poeta" e "A Flor e o Espinho", não eram dele, mas de Guilherme de Brito?

Sendo que, em "A Flor e o Espinho", é comum que se omita um terceiro e ilustre parceiro: o funcionário público Alcides Caminha, mais famoso pelos "catecismos" pornôs que desenhava com o nome de Carlos Zéfiro. Caso sério.

Folha de São Paulo, 11/02/2024