"'Não sou ministro. Estou ministro.' A frase, pronunciada pelo então ministro da Educação, em sua simplicidade radical ficou sendo uma das melhores expressões do velhíssimo problema que tenta definir a relação do intelectual com o poder. Pronunciou-a, em causa própria, Eduardo Portella, que aceitara o cargo num momento em que a morte da ditadura e a abertura política eram consideradas iminentes.
O tema (cultura e poder) frequenta sua obra de ensaísta e crítico de literatura. Um de seus livros, publicado pela Tempo Brasileiro, editora que fundou e até hoje dirige, tem o título de "O Intelectual e o Poder".
Nele, o ensaio "O renascimento da utopia" desenvolve magistralmente aquela frase pronunciada num momento de sua biografia: 'E daí também a necessidade de o intelectual guardar, como arma não tão secreta, o trunfo da insubmissão. A alternativa da insubordinação deve recuperar o ser do estar. Até porque nós só temos o que podemos perder; o que não podemos perder nos tem'.
Baiano, formado em Recife, onde conviveu com Gilberto Freyre, Portella fez estudos na Espanha, quando foi aluno de Dámaso Alonso e Carlos Bousoño; mais tarde, na Itália, onde recebeu aulas de Ungaretti; e de Bataillon, no Collège de France e na Sorbonne, tornando-se, assim, o crítico mais bem equipado de sua geração. Portella construiu uma sólida reputação não apenas na crítica da literatura, mas nos assuntos brasileiros em geral."
O texto acima foi escrito há mais de dez anos, quando do lançamento de mais um livro de sua famosa série "Dimensões". Estamos agora comemorando os seus 80 anos, com bela exposição na Academia Brasileira de Letras sobre sua vida e obra. Além de ser das mais brilhantes, sua trajetória pessoal e literária dá dimensão cultural ao nosso tempo.
Folha de S. Paulo, 16/10/2012