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A oposição, irrelevante e inaudível

 

Em boa hora o senador Marco Maciel, paladino de nossa democracia profunda, veio à cobrança de um desempenho de relevo e sentido para o DEM. Reclama-lhe uma visão consistente de oposição para além do oportunismo imediato, mais que deplorável, e desatenta à disciplina e ao jejum a longo prazo, para qualquer volta ao poder. O senador tem noção da distinção cada vez maior do país que emerge às algaravias que tornam inaudíveis, hoje, as idas à tribuna do anti-governo, na rotina do Congresso.


Que mais a dizer, no monocórdio das denúncias dos cartões de crédito, que encontrou a litania do moralismo, na seqüência dos mensalões, na indiferença crescente do Brasil de Lula? Os dedos em riste dessas lideranças têm reflexos do golpismo que, justamente, o governo do PSDB já deixara para trás nesta consciência democrática para ficar, do Brasil da virada do século.


Acostumamo-nos a essa retórica intemporal, da denúncia sem resposta; do detalhe buscando o cisco da prova; da contraprova aguardando os autos; do indício perdido no dossiê; do contra-dossiê esperando a sua senha, que levou a oposição à ferocidade domesticada em voyeurismo, à cata da próxima e inútil descoberta.


A história não se faz pelos desvãos do irrelevante, nem a sua minudência traz surpresas a um déjà-vu da política brasileira; da sua corrupção crônica e mais que consentida, a que podem sucumbir, inclusive, as forças de renovação, quando uma mudança estrutural não ganha o nível de uma nova consciência coletiva. E esta não se faz sem uma virada de página que, ao mesmo tempo, leva tempo e nasce da percepção efetiva, de que o país de Lula, seus defeitos e também suas esperanças, não repetem por inteiro as do país de todo o sempre.


As próximas eleições municipais tornarão irreconhecíveis as oposições, numa festa gulosa que leva todos os prefeitos, hoje, a buscar Lula no palanque e à ratificação desta nova consciência popular, a partir do chão do município brasileiro. Maciel, como estadista, tem noção do larguíssimo prazo em que se poderão, ainda, rearticular as polaridades que reclama a natureza da democracia e a conservação do dissenso criador, num país das liberdades e da manutenção essencial das diferenças de opinião. Mas é num eixo largo dessas novas alianças que se procurará este jogo da esperança de largo prazo, tentado pelo imediatismo da chegada ao poder, e até pela perversão de um terceiro mandato.


De toda forma, não é um novo PT que sairá da opção por Lula, mas destas lideranças emergentes, mal plotadas ainda nos palanques quase anônimos que começam. Nem se pode neles encontrar uma pedagogia de frentes de esquerda promissoras, no esfacelamento dos purismos ideológicos anti-Lula e nos narcisismos dos mini partidos que ameaçam de logo soçobrar da cláusula de barreira. Os situacionismos clássicos vão se contradizer na dinâmica dos mercados da globalização e do que sejam os estritos interesses do mercado interno e dos setores exportadores, colhidos pela mesma onda da nossa prosperidade, e do nosso avanço nas oportunidades financeiras internacionais.


O ineditismo hoje do Planalto poderia levá-lo, sim, e a bem de superar as perigosas unanimidades políticas a uma pedagogia realmente definidora de novas correntes de mudança entre os seus aliados excessivos. Mais do que nas dissidências pretéritas é pela busca desta prospectiva que o governo distinguirá entre as novas clientelas chegadas ao poder e genuínas lideranças emergentes, e reforçarão à sociedade civil frente aos sindicatos imobilizados, prestigiarão as novas forças dos movimentos sociais e, sobretudo, o dinamismo dos "sem terra" e agora dos beneficiados pelo bolsa-família, frente às próprias formações sindicais.


A novidade hoje de Lula é a de antecipar-se a um planejamento de futuro, fora das tentações carismáticas, e de uma inércia tépida num pseudo começo do bem estar generalizado no país. Um DEM que ouça Marco Maciel, se prepara para esses largos prazos, do compasso da verdadeira mudança em que a democracia avança sobre os imediatismos majoritários e, de vez, aposenta os moralismos golpistas.


Jornal do Commercio (RJ) 16/5/2008