RIO - A popularidade de Lula, de 84% nesses idos de março, é o dado inédito das projeções políticas do nosso crescente desenvolvimento sustentado. Não é uma componente esperada da maturação da mudança, mas um lance fundador, do que possa ser uma tomada de consciência da mudança radical dos cenários da nova década. O homem do Planalto se solta de qualquer carisma original no seu êxito e independeu, por inteiro, dos sucessos ou fracassos do PT.
Curiosamente, ao mesmo tempo, não se definiu uma nova geração de lideranças petistas que tornasse inquestionável uma chapa subsequente ao ganho de 2002. Ao mesmo tempo, lá fora, o perfil do presidente cresce nesta dimensão emergente do Brasil, saído da América Latina para o protagonismo dos Brics e a consolidação de um genuíno regime democrático. Lula surge como o anti-Chávez e o natural interlocutor de Obama, ainda estranho ao conhecimento do continente.
A recente conferência dos prefeitos brasileiros se transformou num verdadeiro Armagedon, na competição olímpica pela foto ao lado do presidente e o símbolo quase fetiche do abraço, do olhar ou do grupo fotográfico, por mais que numeroso. E é um aliancismo político generalizado o que hoje empurra as lideranças partidárias a largar-se de todos os entraves ou porteiras das siglas. Esta quase impunidade cívica em que cresce o povo de Lula tornou-se imune também aos perigos de crise e o sucesso decorre do fluxo de recursos salvos pelo PAC, nos resultados em que já afloram no país, à margem de qualquer rebarba de oposição.
O que mais impressiona, no momento de remate do mandato de Lula, é esse andar do processo à margem da sucessão, mormente após a peremptória declaração contra qualquer mudança constitucional, que respondesse ao óbvio antecipado de um plebiscito. É como se o inconsciente político brasileiro não acordasse para a implacabilidade da sucessão, toda silenciada pela satisfação do agora, fruído sem qualquer ideia de virada de página ou mudança.
A se figurarem no seu jogo clássico de oposições, os governos estaduais e prefeituras não têm como fazer subir ao ringue uma candidatura que seja, de fato, o anti-Lula. A sucessão não se definiu ainda como real confronto de vontades políticas, e os nomes de frente – como o de José Serra – crescem no vácuo do que seja, afinal, a efetiva vontade do presidente ao entrar no jogo.
Não é também sem razão que, para amarrar os seus pontos de êxito inicial, Serra repete o perfil do PAC em São Paulo, como percepção a definitiva pelo país do que seja a política do novo, e de ruptura, de vez, com o establishment que tem o seu dó de peito recorrente no tucanato.
Demora a candidatura do Planalto, no que só dependa do gesto, sobre o pressentido. E se chega a Dilma numa lógica inequívoca, que não precisa de contagem regressiva. Passando, de fato, ao pleito, a candidata vai à catadupa dos votos, neste desrepresamento irreprimível do povo de Lula, saído da festa, para reencontrar o futuro.
Jornal do Brasil (RJ) 04/03/2009