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Olinda, Olindíssima

 

Estou espantado com a amnésia voluntária e ao redor do reconhecimento de Olinda como Patrimônio da Humanidade, no jubileu de prata da data. Espanta-me o risco disso tudo se encaminhar para grosseira desmemória e que tenhamos enfim chegado a tal desconforto.


Compreendo o que essa alta e nobilitante distinção significa pois quando Secretário da Cultura do MEC, pernambucano amante da sua terra e de sua gente, que sucedeu no cargo - sem pretensões de substituir - a outro pernambucano devotado, Aloísio Magalhães, segui-lhe no trabalho em favor de Olinda, epopéia do nosso civismo e do amor à tradição.


A marcha triunfal do grande ideal animou a todos. Era como que um sigiloso desafio de enfrentação comum. Ninguém faltou com o seu contributo. Olinda, o povo e as autoridades; Pernambuco, os governos de Marco Maciel e Roberto Magalhães, e as gentes todas; o Brasil, seus Ministros Eduardo Portella, Rubem Ludwig, Esther de Figueiredo Ferraz; o Ministério das Relações Exteriores, com os seus qualificados profissionais - talentosos, cultos, patrióticos; os técnicos da Secretaria da Cultura; a Unesco, na acolhida dos dirigentes e no aval dos seus especialistas de saberes vários.


À semelhança de Ouro Preto, tínhamos legado artístico, paisagístico e histórico. Olinda nos conferia inquestionável igualdade de condições para obter idêntico galardão.


Fui incandescente alma pernambucana no frio daquele dezembro de 82 em Paris, a participar da consolidação da vitória, no plenário soberano da Unesco, defendendo Olinda, em nome do Brasil, num trabalho de muitos meses.


Deixem-me dizer: EU VI.


Projetada no cenário mundial entre as cidades históricas de maior significação na cultura humana, Olinda bem mereceu a distinção. Os atos fundadores do Brasil subiram pelas suas encostas, escalando-as por ato de vontade. Os atos mantenedores da identidade nacional continuam a ser anunciados de suas cumeadas, onde ganharam morada definitiva. Sua lição é uma permanente harmonia entre a arte e a tradição histórica, entre a paisagem talássica e a vida urbana permeada de monumentos sagrados e profanos que lhe compõem o perfil.


Veio com um destino traçado: teria que ser na especulação do próprio nome o lindo cenário que lhe daria preeminência no complexo urbano.


Olinda é o encanto doce, bonito, musical, colorido. É o mais ver; é o sentir amplo, do alto de suas colinas vendo, para frente: o mar para trás: a terra. Marcada pelo barroco, ainda hoje cuidamos ver os seus antigos beneditinos, jesuítas e franciscanos descerem as ladeiras que são caminhos da História, fecundações de vida.


Olinda é tudo isso, as igrejas, os conventos, os cursos jurídicos, a ciência, o povo que mora em casa de porta e janela, o banho de mar, a jangada.


Olinda múltipla, plural, oferecendo aos que a contemplam também o cenário magnífico do seu casario colonial. Olinda de frades e doutores, uma Coimbra tropical onde se iniciou a literatura brasileira. Olinda do gesto romântico de Bernardo Vieira de Mello. Olinda do Capitão Temudo e, igualmente, da Pitombeira e do Elefante, do Homem da Meia-Noite e da Mulher do Dia, de Samico, de José Cláudio, de Luiz Delgado, de Bajado, de Dom Penido, de Janete Costa, de Carlos Trevi.


Olinda, a bela, a linda Olinda deve continuar a ser não apenas Olinda, mas Olindíssima, sem partidarizações dos seus méritos, sem esbofetear a verdade histórica, sem cultivar a mediocridade, sem perder suas virtudes conviviais.


Olinda deve atentar ao seu louvor feito na Assembléia pelo deputado Augusto Coutinho, fiel ao fato histórico, fiel aos valores olindenses, olindensimente pernambucano.


Diário de Pernambuco (PE) 27/1/2008