Poderíamos perdoar tudo a FHC, esquecer, mas não perdoar seu governo mais do que suspeito, recheado de escândalos, a criminosa impunidade que bancou e incentivou, chegando a nomear para o STF um advogado que abafou, não com argumentos jurídicos, mas com outro tipo de argumento, todas as CPIs que a nação então exigia.
Poderíamos perdoar seu pernosticismo acaciano, mestre no dizer obviedades que já foram ditas à exaustão. Mas como perdoar sua atual fase de trator contra o governo que o sucedeu e cujo erro maior (e praticamente único) está sendo repetir os mesmos erros que ele cometeu, inclusive a corrupção reinante nos altos e médios escalões da vida pública?
Dos 170 milhões de brasileiros, somente um, o próprio FHC, não tem o direito de reclamar de Lula e do governo petista. Por vários motivos, desde a sua condição de ex-presidente. Nem Jânio Quadros (que o derrotou numa eleição municipal que ficou na história), que odiava pessoalmente o antecessor e não era flor que se cheirasse, ousou violentar a moral e os bons costumes políticos atacando aquele que legitimamente o sucedeu.
Gosto de repetir a máxima que aprendi na lógica de Aristóteles: "affirmatio unius non est negatio alterius" (não cito em grego por falta de fontes gráficas no meu notebook). A afirmação de uma coisa não é negação de outra. Criticar FHC pela sua desembestada campanha contra Lula não significa que Lula seja um querubim, um Sólon, um Licurgo, uma vestal. Pelo contrário.
Lula tem sido tão desastrado como FHC - daí que acredito na sua reeleição. Ele não terá escrúpulo, como seu antecessor não teve, de repetir todos os desatinos para se reeleger, com exceção da indecente compra de votos para emendar a Constituição a seu favor - jogada que teve preço maior do que qualquer caixa dois ou três do atual governo.
Lembrei há pouco que um burro coça outro burro. Para repetir o latinório, "asinus asinum fricat".
Folha de São Paulo (São Paulo) 14/2/2006