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O Rio que não se vê

 

Às vésperas da Olimpíada, o Rio está com uma cara parecida com a do período pré-carnavalesco, com a diferença de que há por parte das autoridades uma indisfarçável tensão por causa dos problemas de segurança. Mas nas ruas não se nota isso. O clima é de festa, principalmente para os turistas. O calçadão da orla está falando várias línguas, até a nossa, e os estrangeiros são reconhecidos à distância pela vermelhidão dos rostos, queimados por esse nosso sol de inverno. Os bares e quiosques andam cheios e, na areia, os ambulantes parecem felizes com o movimento. 

Mas nesses momentos se observa também que nossos pontos turísticos estão muito repetitivos. As praias superlotadas e as intermináveis filas para o Corcovado e o Pão de Açúcar dão a impressão de que só temos a oferecer atrações naturais, o que alimenta a imagem-clichê de que o Rio é uma “cidade geográfica”, enquanto Salvador é uma “cidade histórica”. Por isso, é oportuna a publicação agora do guia “Rio secreto” (*), com a indicação de 241 lugares ou aspectos desconhecidos ou pouco conhecidos não só dos forasteiros, como dos próprios cariocas, além de detalhes de locais que frequentamos “sem notar”, como informam os autores.

Uma dessas revelações é a cela de Tiradentes, no Hospital Militar da Ilha das Cobras, como “provavelmente um dos maiores segredos históricos da cidade”. Há descobertas sem o mesmo valor, mas interessantes, como o Museu da Bíblia, o Edifício Neoegípcio, de 1910, “uma das mais belas realizações arquitetônicas da cidade”, ou a fachada do Espaço Franklin, com seus 13 vitrais franceses em forma de cauda de pavão. Ou o Cemitério dos Pássaros, o único do mundo, sem falar no São João Batista, que guarda a “primeira escultura abstrata do Brasil” e no Cemitério dos Anjinhos, “um dos lugares mais secretos e impressionantes da cidade” (em Paris, o Père-Lachaise recebe mais de dois milhões de visitantes por ano, mas aqui achamos esse turismo meio mórbido). E o Projeto Morrinho, você conhece? É uma instalação artística reproduzindo em tamanho reduzido a Favela do Pereirão. Já correu o mundo e foi exposta na Bienal de Veneza e no Moma, de NY (agora está no MAR). 

Há muito mais, como o Hangar do Zeppelin para dirigíveis de grande porte. Mas que não cabe neste espaço. Não deixa de ser curioso que uma cidade tão exibida ainda guarde tantas partes de nossa história escondidas. É uma espécie de Rio que praticamente não se vê.

(*) “Rio secreto”, de Manoel de Almeida e Silva, Marcio Roiter e Thomas Jonglez. Editora Jonglez.

O Globo, 03/08/2016