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O que é, mesmo, independência?

 

Às margens do Ipiranga, todos gritaram vivas e partiram; o carreteiro ficou intrigado com aquela cena.




Aquele 7 de setembro foi, para o carreteiro que aparece na famosa tela do Pedro Américo, um dia de trabalho duro. Foi com enorme esforço que conseguiu acomodar na carreta as enormes e pesadas toras que tinha de transportar; levou horas fazendo isso.


Exausto, com dor nas costas, tudo o que queria era entregar as malditas toras, voltar para sua humilde choupana, comer alguma coisa e dormir. No caminho, porém, a surpresa; de repente, deu com um grande grupo de cavaleiros parados no alto da colina.


Não era da região, aquela gente; o carreteiro não conhecia nenhum deles. Estavam muito bem vestidos e montavam garbosos cavalos, os cavalos que o carreteiro sempre sonhara atrelar à sua carreta no lugar dos vagarosos bois.


Aquele que parecia ser o chefe estava lendo alguma coisa, uma carta, talvez, e que, pelo visto, acabara de lhe ser entregue. Ao terminar, resmungou algo, puxou a espada e gritou: "Independência ou morte!". Entusiasmados, todos gritaram vivas e arrojaram para o ar seus chapéus. Depois partiram a galope.


O carreteiro fez a entrega das toras e seguiu para casa, ainda intrigado com a cena que tinha visto.


A mulher esperava-o. Solícita como sempre, e obediente à rotina, perguntou ao marido como havia sido o seu dia.


Normalmente ele rosnaria uma resposta qualquer; mas, por alguma razão, resolveu contar o que tinha visto às margens do Ipiranga: "Era gente fina, todo o mundo a cavalo. Veio um mensageiro e entregou para o chefe deles uma carta. O homem leu, fechou a cara, depois puxou a espada e gritou: "Independência ou Morte'".

Que coisa, murmurou a mulher, impressionada:


- "Independência ou morte". Você tem ideia do que ele quis dizer com isso?

O carreteiro dá de ombros:

- Nenhuma ideia.

E olhou-a, irritado:


- Escuta, mulher, quem sabe você para com essa conversa fiada e me dá alguma coisa para comer? Você é idiota mesmo, não vê que estou morrendo de fome?

Ela foi para a cozinha, preparar um prato de arroz com feijão. Mas aquela coisa de "Independência ou morte" não lhe saía da cabeça. Suspirou: um dia descobriria o significado dessas palavras. E quem sabe, então, sua vida mudaria.


Folha de São Paulo, 6/9/2010