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O papa e a maçã

 

Nesta semana, o papa Francisco criticou a obsessão da igreja pelo sexo, manifestada, sobretudo, na condenação ao aborto e ao casamento gay. O cristianismo herdou do judaísmo (Velho Testamento) essa abominação pelo sexo, bastando lembrar que o pecado original, que não foi criação cristã, ficou reduzido ao símbolo da maçã comida por Adão e Eva.

Acontece que os dois já tinham filhos na ocasião. Ao criar o homem e a mulher (Gênesis 1,28), Deus ordenou que eles crescessem e se multiplicassem. Seus filhos foram fabricados pelos métodos tradicionais, não havia ainda o bebê de proveta. O pecado que os expulsou do paraíso foi a ambição de serem iguais ao Criador, comendo a fruta da árvore do bem e do mal.

Estou citando o Gênesis, primeiro livro da Torá, que o cristianismo, séculos depois, absorveria. O episódio de Sodoma e Gomorra também pertence à Torá. No Novo Testamento, há o perdão da meretriz e a mensagem cristã transcende ao sexo, é genérica. Ernest Renan, o autor que mais influenciou o final do século 19, diz que o "cristianismo é o judaísmo bem-sucedido", tornado universal pela pregação de Paulo, que levou os ensinamentos da Torá aos gentios, acrescidos pela pregação de Cristo.

A ruptura se deu pela circuncisão, substituída pelo batismo. Séculos depois, Lutero foi a Roma e se escandalizou com a venda das indulgências. O papa vendia o céu para construir uma basílica. Havia depravação na corte pontifícia, mas não foi por isso que Lutero escreveu a bula afixada na catedral de Wittenberg, na Alemanha, rompendo definitivamente com Roma e iniciando a Reforma.

Tudo isso junto, ao longo dos séculos, formou a "obsessão" da igreja pelo controle (ou condenação) da sexualidade em geral.

Folha de S. Paulo (RJ), 22/9/2013