Somos pais de nossos filhos, mas somos também os irmãozinhos deles.
Esses dias apareceu na tevê uma reportagem sobre adolescentes, rapazes e meninas, que, de repente, se tornam pais e mães: uma tragédia psicológica e social resultante do descompasso entre a biologia e a maturidade emocional, um descompasso que se torna cada vez maior, na medida em que aumenta a expectativa de vida e expande-se aquele período que conhecemos como adolescência. Quando, por descuido, por imprevidência, ou até por uma questão de desafiadora auto-afirmação os jovens não adotam precauções para evitar a gravidez, veem-se de repente confrontados com uma realidade que faz parte da vida mas que, antecipada, adquire o caráter de problema, quando não de desastre.
Foi entrevistado no programa um rapaz de 16 anos, não identificado (seu rosto, como manda a legislação, aparecia desfocado), mas que, mesmo assim, falou sobre sua condição de pai estreante e involuntário. Seu tom era uma mistura de resignação, de perplexidade, mas, curiosamente, também de alegria, modesta alegria: afinal de contas, a paternidade é uma realização, e, para gente pobre, por vezes é uma das poucas realizações possíveis. De qualquer maneira, ele parecia otimista: vou arranjar emprego, disse, vou trabalhar, vou criar meu filho. Ou seja: a natureza estava falando mais alto, o instinto de paternidade já estava nele se manifestando. Mas isso é apenas o começo de uma longa história, feita de noites sem dormir, de momentos de angústia (criança doente assusta qualquer pai), de preocupações. E junto, o júbilo que nasce do primeiro sorriso, do primeiro passo, da primeira palavra. No caso desse rapaz, a paternidade tem um outro significado. Ele está dando adeus à própria infância, está dando adeus à sua juventude. Adeus, skate. Adeus, baladas. Adeus, colégio. Eu agora sou um pai. Sou um senhor.
É? É mesmo um senhor? Um senhor pai? Será que ele não vê no bebê antes um irmãozinho, talvez o irmão que não teve? E será que o filho também não o verá da mesma maneira? Afinal, a imagem paterna sempre está associada à de um homem velho; o próprio Deus-Pai é representado assim, um senhor idoso, longa barba branca. Pai jovenzinho não é bem pai.
Mas isso, convenhamos, não tem importância: acontece em maior ou menor grau com todos os pais e filhos. Somos pais de nossos filhos, mas somos também os irmãozinhos deles (e às vezes, quando doentes ou senis, os filhos deles): velhos, mas meninos, velhos-meninos. E volta e meia regressamos à infância; por exemplo, quando recebemos o presente de Dia dos Pais. Por um momento recuperamos a alegria que tínhamos quando, rapazinhos, soprávamos as velas do bolo de aniversário.
Mas só por um momento. Em seguida a hierarquia se restabelece. Em seguida nos tornamos de novo pais. E dizemos, ao abrir o presente: "Ora, não precisava, eu já tenho chinelos iguais a esse." E rapidamente viramos o rosto, para que o nosso filho não veja as lágrimas do gurizinho.
Zero Hora (RS), 8/8/2010