- Ih, achei que estava chegando cedo e já encontro vocês todos esbravejando e xingando o governo e falando mal de tudo, que coisa!
- E tu quer que alguém fale bem de alguma coisa?
- Quero! Quero! Ou então falem de mulher, nunca mais se falou em mulher aqui. Aliás, mulher nem encosta mais aqui, com este baixo-astral, esta mistura de velório com broxura, vamos parar com isso! Broxura cívica, ha-ha-ha! Broxura cívica, querem vocês. Tesão patriótica, digo eu! Sacou? Eu hoje estou com a macaca, respondo qualquer coisa.
- Não é possível que você esteja achando tudo bom.
- Estou, estou! Não tenho queixa. Eu sou um otimista nato, vou a qualquer extremo para defender o otimismo, não vou morrer tortinho e cheio de estresse como vocês. É uma questão de perspectiva. Da perspectiva otimista vai tudo bem mesmo. Aliás, nosso problema é o pessimismo. Se não fosse ele, estaríamos muito melhor.
- Ah, então vamos ver. Atenção, pessoal, o Bigode está dizendo que basta otimismo para salvar o Brasil.
- E basta mesmo. O que dá pra chorar dá pra rir, cara, com todo o respeito ao grande Billy Blanco. Olha aqui, hoje eu estou armando uma tenda de pai-de-santo otimista aqui, podem perguntar tudo, que eu derrubo qualquer coisa no otimismo. Pergunta aí, vai.
- Então esclareça aqui uma coisa que a gente vinha discutindo quando você chegou, só essa já vai pegar você. É o seguinte: tu entendeu o que aquele general explicou sobre as despesas da Presidência tipo segurança nacional?
- Entendi perfeitamente, ele falou português, não falou?
- Ah, tu tá querendo sacanear, tu sabe que não é isso o que eu quero dizer. Claro que ele falou português e todo mundo entendeu o português.
- Agora quem ficou sem entender fui eu, cara. Vamos na lógica silogística: 1)todo mundo aqui entende português; 2)ele falou português; 3)logo todo mundo entendeu o que ele disse. Lógica aristotélica da melhor qualidade. E agora tu vem me dizer que ninguém entendeu? Não é verdade, todo mundo entendeu.
- Saco, Bigode, tu sabe o que eu quero dizer!
- Claro. Tu falou português, eu falo português e portanto sei.
- Tu quer curtir com a cara da gente mesmo, deixa pra lá.
- Deixa pra lá, não, eu avisei que tudo aqui ia ser dentro de uma perspectiva otimista. Se você quer ouvir o ponto de vista otimista, só podia querer ouvir isso que eu falei.
- Tá legal. Do ponto de vista otimista, o que foi que o general disse sobre despesas envolvendo a segurança nacional?
- Essa também é mole. Disse que despesas que envolvem a segurança nacional são despesas que envolvem a segurança nacional.
- Muito bem, e o que são essas despesas, dê um exemplo.
- Vamos lá. Vamos supor que um dos 86 ministros, por falta do que fazer, goste de chupar pirulito, nos intervalos das sonecas da reunião. Aí um terrorista descobre isso e envenena o pirulito do ministro. Daí a uns dois ou três dias, quando descobrissem que o ministro não estava mais dormindo, o mal já estaria feito. Melhor prevenir que remediar.
- O pirulito do ministro. Bigode, você...
- Podia ser até pior, podia ser o Pirulito Presidencial, só que não contam com a astúcia dele, que não pára de falar e não dá tempo para enfiarem nem um chiclete, quanto mais um pirulito, na boca dele.
- É, faça sua piadinha otimista, mas o general mesmo também disse que não saberia bem enumerar as despesas devidas à segurança nacional.
- E não deve saber mesmo. De repente o presidente passa a gostar de sorvete de tapioca e se esquece de avisar ao general, já imaginou nova crise da tapioca? O País não ia agüentar.
- Mesmo assim, já formaram duas CPIs para investigar.
- Medida de economia! Nenhum otimista vai deixar de ver isso imediatamente.
- Bigode...
- Tá na cara! Em que é que essas CPIs vão dar?
- Em pizza. Isso todo mundo sabe.
- Mas você disse isso num tom pessimista e fica infeliz. O otimista vê isso e fica feliz. Já que ambas vão dar em pizza, faz-se somente uma comemoração e economiza-se a outra. Isso para não falar na possibilidade de que alguém queira botar veneno na mozarela do dr. Garibaldi e olha mais uma despesa de segurança nacional aí.
- É cara, pensando bem, de certa forma você tem razão, tem que ver as coisas assim mesmo.
- É claro! A vida é curta e vivemos num país feliz, com o melhor presidente do mundo, já temos o mesmo presidente aí engatilhado, o esquema necessário está sendo somente ajustado e...
- Espere aí. Outro dia ele chegou quase a gritar, dizendo que não queria saber de terceiro mandato.
- Por isso mesmo. Faz parte. Já se sabe até o nome do primeiro candidato que ele disser ou sugerir que vai apoiar.
- Você já sabe o nome?
- Bem, mais ou menos. Genericamente, digamos. É Boi-de-piranha.
O Globo (RJ) 13/4/2008