A partir da denúncia do Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, ao Supremo Tribunal Federal, pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o que deve acontecer ainda hoje, o deputado Eduardo Cunha passará de todo-poderoso líder político a investigado na Operação Lava-Jato, o que lhe retira boa parte do poder que esbanjava.
A concretização da acusação fragilizará a posição de Cunha, que enfrentará necessariamente um movimento dentro da Câmara pela sua renúncia ao cargo. Provavelmente ele ainda tem uma maioria que o apóia, mas ficará exposto à execração de um grupo político suprapartidário que tirará de seus atos a legitimidade.
Se como conseqüência de sua denúncia Cunha acelerar o processo de impeachment contra a presidente Dilma, por exemplo, ficará do ato a suspeita de que se trata de uma retaliação pessoal.
Eduardo Cunha tentou nos últimos dias vários movimentos para reverter sua situação e pelo menos retardar o processo contra si, todos infrutíferos. O ministro Teori Zavascki, que é o relator da Operação Lava-Jato no Supremo, não aceitou os argumentos da defesa de Cunha para retirar da Justiça Federal do Paraná a investigação sobre os contratos de navios-sondas pela Petrobras com a Samsung, pelos quais, segundo delação do empresário Júlio Camargo, Cunha teria recebido propina de US$ 5 milhões.
Nesse mesmo processo, Cunha é acusado de ter usado sua influência política para chantagear a Samsung quando a empresa coreana desistiu do negócio. A Procuradoria-Geral da República, investigando o caso, descobriu que saíram do computador da presidência da Câmara textos de projetos que prejudicariam a Samsung, apresentados por uma deputada ligada a ele.
O Procurador-Geral Rodrigo Janot por duas vezes pronunciou-se sobre acusações de Cunha contra a ação de investigação, uma ao Supremo Tribunal Federal e outra à própria Câmara, respondendo a questionamento do deputado do PSOL Chico Alencar. Nos dois casos, Janot acusou Cunha de usar a Câmara em seu benefício próprio, sendo acionando a Advocacia Geral da União (AGU) ou acusando os Procuradores de terem invadido a privacidade dos 513 deputados federais para investigar Cunha.
Alguns parlamentares já preparam o pedido de investigação de Cunha pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Casa, o que pode, em tese, resultar na perda de seu mandato. O hoje presidente do Senado, Renan Calheiros, já teve que renunciar ao cargo quando uma denúncia contra ele foi levada ao Conselho de Ética. Cunha garante que não renunciará, mas o futuro a Deus pertence.
Mesmo que o movimento seja incipiente no momento, Cunha hoje está isolado politicamente e é provável que passe a ser um fardo muito pesado para ser carregado por seus aliados, que lhe devem favores mas não lealdade. Sua teoria da conspiração de que o governo, mancomunado com o Procurador-Geral da República, montou toda a denúncia contra ele e protegeu políticos que estão aliados ao governo num “acordão” para salvar a presidente Dilma – referência indireta ao antigo aliado Renan Calheiros – não tem base real nem fôlego para motivar a oposição a apoiá-lo, nem vai emocionar seus aliados.
Tanto ele quanto Calheiros montaram inicialmente uma estratégia de proteção, depois de surgirem na lista de Janot de investigados. Os dois tiveram um ativismo político para protagonizarem as ações no Congresso e se passarem por vítimas caso fossem denunciados. No momento da denúncia, Cunha não tem histórico político para se apresentar como vítima de um governo corrupto, e Renan mudou a aposta, mas não é certo que escapará do Ministério Público.