A dúvida básica quanto à escolha de um novo ministro do Supremo é sobre sua fidelidade. Ele ou ela será fiel ao partido, à ideologia, à própria pessoa do presidente da República que lhe indicou? E aos senadores que aprovaram? Ou lhes será independente?
Na nossa situação atual, acredito ser esta dúvida quase ultrapassada. Desatualizada. Parece que está havendo uma inversão.
O candidato, e são muitos, tem que se mostrar fiel ao presidente e aos senadores antes da indicação. Tem que merecer ir ao Supremo por serviços já prestados. E não por serviços a prestar.
Vivemos situação muito peculiar. São muitos os processos judicializados e as investigações em curso que tocam à presidência, sua família, alguns dos senadores e seus familiares também.
A nomeação de um ministro que já tenha prestado serviços é mais segura do que a de um que ainda poderá vir a prestá-los. Ou não.
O Supremo será decisivo.
Hoje a Presidência e alguns senadores precisam, por exemplo, de um ministro da Justiça litigante a seu favor, inclusive nos autos. O que é pouco usual. Precisam que a Procuradoria-Geral da República acate suas teses. Precisam parar ou adiar processos onde são investigados os denunciados. Precisam libertar testemunhas incômodas e atualmente na cadeia. Precisam parar forças-tarefas contra a corrupção.
Precisam de órgãos de controle que controlem sem lhes causar danos. Ou que controlem apenas seletiva e vagarosamente. Precisam dificultar e submeter a Polícia Federal. Precisam lhe trocar a pauta. Que investiguem e prendam outros. Mas não os seus.
Precisam de congressistas para reforçar sua base evangélica, por exemplo.
Precisam mais da fidelidade agora, ex-ante. Do que depois, ex-post.
Mesmo porque a fidelidade a posteriori não é garantida. Nem aqui, nem em democracia alguma. A independência do cargo pode ter mais peso do que a fidelidade pessoal. Às vezes demora. Mas presidentes passam, e ministros permanecem.
O PT que o diga, diante da independência de Joaquim Barbosa, Ayres Britto, Cezar Peluso e outros durante o mensalão. O regime militar que o diga, diante do desassombro de Adaucto Lúcio Cardoso, conforme narra Felipe Recondo em seu livro “Tanques e togas: O STF e a ditadura militar”. Dilma Rousseff que o diga, diante do atuante Luís Roberto Barroso.
Agora mesmo, o presidente da Suprema Corte americana, John Roberts, e o justice Neil Gorsuch, indicados por sua sintonia com os ideais republicanos, de George Bush e do próprio Donald Trump, votaram a favor dos direitos das populações LGBTQ.
O que mereceu o seguinte tuíte de Donald Trump, em 18 de junho: “Estas horríveis decisões politicamente carregadas que estão vindo na Suprema Corte são tiros que estouram na cara das pessoas orgulhosas de serem chamadas de republicanas e conservadoras” (tradução livre).
Pesquisa recente sobre indicação de membros para nosso Supremo, no livro “Supremo interesse”, do professor Álvaro Jorge, indica, sintomaticamente, que muito tem crescido o número de ministros cuja origem tenha sido em proximidades ou em cargos federais. Cerca de 60% entre 1988 e hoje.
Já foi dito que se queres controlar uma pessoa, não controle seu presente. Controle seu futuro. Controle sua ambição. Seu desejo. Controle a vaidade de seu futuro.
O poder às vezes é como o amor. Quanto mais desejo, maior o vínculo da entrega.
Possivelmente, o presidente da República controlará a ambição dos candidatos até o dia que forem aceitos. São muitas as ambições.
O sucesso desta estratégia de indicação será fazê-los competir agora. Por palavras, atos ou omissões.