Apesar de acompanhar com tédio os eventos públicos, fico impressionado quando os chefes de Estado se encontram em reuniões coletivas ou setorizadas, geralmente um com outro, quando então se deve esperar dos dois mandatários mais substância e objetividade nos pronunciamentos, intenções, concordâncias ou mesmo discordâncias acaso existentes.
Bem verdade que os encontros com chefes de Estado e de governo são agora bem mais freqüentes em todas as partes do mundo, e não se pode negar a oportunidade que fornecem para aproximar, social e pessoalmente, os responsáveis pelo destino das nações.
Lembro que Saddam Hussein, flor que não se cheira, nas última semanas que antecederam o ataque dos Estados Unidos ao Iraque, pediu de mão postas a intermediários da ONU que o presidente Bush (que também não cheira bem) fosse pessoalmente, acompanhado de seguranças e técnicos que o próprio Bush escolheria, verificar as tais instalações de armas nucleares que serviriam de motivo para a invasão - motivo posteriormente desmoralizado e negado pelo próprio governo norte-americano.
Uma reunião dos dois contrários poderia, em tese, não digo evitar a guerra, mas reduzi-la em mortes para os dois lados.
Mesmo assim, em linhas gerais desconfio que as reuniões são inúteis e eventualmente ridículas, quando conversam sobre o óbvio ou sobre uma agenda que não é levada a sério pelos dois lados. Lembro a piada do surdo que foi convidado a almoçar com um amigo. Veio o garçom, ofereceu o cardápio a quem reservara a mesa. O sujeito leu aqui e ali, não se entusiasmou e disse: "Nada. Estou sem fome".
O garçom levou o cardápio ao convidado, que se recusou a examinar os pratos oferecidos. Sendo surdo, não tendo ouvido o que outro pedira, foi taxativo, simplificando a coisa: "Quero o mesmo que ele pediu, mas sem tomate".
Folha de São Paulo (São Paulo) 22/1/2006