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O mundo coraçãozinho NY

 

Há coisas que nos entram pelos olhos, como uma imagem, uma frase, um slogan, cuja origem desconhecemos e, na verdade, não precisamos conhecer. Mas somos tão assolados por elas que talvez devêssemos nos perguntar: quem inventou isto? Mesmo que seja para não ter resposta —que, afinal, não é tão importante. Suponha, no entanto, que tal aparente insignificância possa estar sendo importante a ponto de alterar todo um estado de coisas —como ressuscitar uma cidade do tamanho de Nova York.

Aconteceu com a própria Nova York. Nos anos 1970, a outrora cidade mais fascinante do mundo chegara ao porão do fundo do poço. Lixo nas ruas, pichações, polícia corrupta, insegurança, crime, violência. Lojas fechando, desemprego. Metrô e Central Park, impraticáveis à noite. Muita droga —no Village, gente no chão com uma seringa no braço. População em fuga —800 mil habitantes foram embora naquela década. Muitos filmes a respeito: "Caminhos Perigosos" (1973) e "Taxi Driver" (1976), com Robert de Niro, "Os Viciados" (1971), com Al Pacino, "Klute" (1971), com Jane Fonda, "O Sequestro do Metrô" (1974), com Walter Matthau. A maçã estava podre.

Como salvar a cidade? Não bastava resolver os problemas, era preciso chamar o mundo de volta. O Comitê do Comércio encomendou uma campanha à Wells Rich Greene, uma agência de propaganda. Um criador da agência, Charlie Moss, bolou a frase "Eu amo Nova York". O artista gráfico Milton Glaser transformou-a em "I ‘coraçãozinho’ NY". Ela pegou. O mundo atendeu ao apelo do eu-coraçãozinho. Podia-se amar uma cidade moribunda.

Milton Glaser morreu em 2020. No dia 5 último, foi a vez de Charlie Moss. O mundo continua coraçãozinho Nova York.

Folha de São Paulo, 25/08/2024