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O mau gosto das mortes virtuais

 

O que dizer dos que se divertem disseminando fake news da “morte” de celebridades? Já mataram virtualmente Fernanda Montenegro, Reynaldo Gianecchini, Renato Aragão, Gretchen, entre outros. A mais recente vítima dessa maldade foi Ziraldo.

No sábado passado, o telefone de sua casa não parou de tocar. Eram amigos do cartunista ligando para a “viúva” dando pêsames, alguns em lágrimas, outros querendo saber o local do velório. Houve uma comoção nas redes sociais.

Na véspera, eu tinha ido visitá-lo e encontrei-o mais bem disposto do que na visita anterior, quando ele estava em processo de recuperação depois de internado no Pró-Cardíaco em consequência de um acidente vascular cerebral. Conversamos e rimos por umas duas horas. Por isso, minha primeira reação foi rejeitar o que, com certeza, seria o boato espalhado por algum desafeto.

Em seguida, porém, fui assaltado pela dúvida (no Rio até as dúvidas assaltam): e se aquela conversa em que ele fez um balanço de sua vida fosse uma despedida? Liguei correndo para Márcia, e ela atendeu rindo: aquele devia ser o centésimo telefonema. O pai do Menino Maluquinho não havia perdido o humor. Debochou da falsa notícia e só queria saber quem tinha chorado — e, sobretudo, quem não chorou.

Ainda bem que existem os humoristas. Eles não levam a sério nem a própria morte. Quando em 1999 a internet também me matou, Verissimo disse coisa parecida. Embora Alguém mais importante tenha levado três dias para ressuscitar, eu levei três horas. Ele achava que eu devia ter esperado para ver que destaque dariam ao acontecimento. Deram pouco.

Bolsonaro não tem jeito. Acaba de afirmar que a questão ambiental “só interessa aos veganos, que só comem vegetais”. Já em Davos, anunciou que a questão era “preocupação de seu governo”. Outra mais grave: acusou grupos terroristas de terem executado o pai do presidente da OAB, enquanto documentos oficiais atestam que Fernando Santa Cruz “foi preso e morto por agentes do Estado brasileiro”.

O Globo, 31/07/2019