Foi uma idéia das mais felizes - e que se realizou pela terceira vez, em Curitiba - o evento intitulado "Livro em Cena", promovido pelo Colégio Decisivo. Nas magníficas instalações da Estação Embratel Convention Center, na capital paranaense, 1.400 pessoas aplaudiram com muita ênfase as apresentações de membros da Academia Brasileira de Letras, fazendo a análise de escritores de nomeada e que costumam ser citados nos vestibulares. A idéia nasceu com Carlos Heitor Cony.
Quem não conhecer particularidades da obra de Ariano Suassuna, por exemplo, está fadado ao insucesso. Desta feita, a análise foi feita do seu clássico O santo e a porca, com o esclarecimento inicial de que o animal referido não é exatamente a fêmea do porco, mas sim um cofrinho de madeira, onde o personagem principal costumava guardar por anos as suas economias, muitas das quais referentes a salários não pagos aos seus funcionários. Coisas bem típicas do simbolismo praticado pelo autor paraibano.
Outro desafio foi a lembrança do premiado O pagador de promessas, de Dias Gomes, autor baiano com muito sucesso no Rio de Janeiro - e que morreu precocemente em desastre de automóvel. O ex-marido da campeã Janet Clair adotou uma linha realista como gênero literário. Brilhou na TV, onde o seu "O bem amado" deixou história, com o paradigmático prefeito Odorico Paraguaçu ("vamos deixar de entretantos e partir para os finalmentes"). Na ocasião de discussão em torno dessa obra de grande repercussão, lembramos suas semelhanças com o clássico "O coronel e o lobisomem", de outro renomado acadêmico da nossa literatura: José Cândido de Carvalho. O curioso é que a ambiência deste último é a cidade de Campos dos Goytacazes, enquanto o escritor baiano criou uma cidade fictícia, que pode ter se situado no interior do seu Estado. Pura coincidência? Vamos deixar que corra essa versão mais cômoda.
Nélida Piñon falou, a pedido dos diretores Índio do Brasil e Jacir Venturini, a respeito de D.Casmurro, uma das maiores obras de Machado de Assis, e o pequeno mas consistente livro de José de Alencar intitulado Como e porque sou romancista. É um texto que nasceu como folhetim, num jornal do Rio, mas que sintetiza tudo o que deve conhecer um candidato a escritor, com pendores para o romance. Por essa razão, Alencar é considerado o pai do romance brasileiro. Foi muito aplaudida, como sempre, pelo seu poder de síntese e a forma apaixonada como se refere è literatura brasileira, sendo ela uma das nossas autoras mais conhecidas lá fora, detentora de vários prêmios, especialmente no mundo hispânico.
O professor Juarez Poletto, mestre querido de Literatura dos alunos do Colégio Decisivo, deu a sua colaboração, arrancando aplausos dos alunos por sua magnífica análise crítica de Leão de Chácara e Muitas Vozes. Depois do almoço foi a vez do acadêmico e jornalista Cícero Sandroni, hoje Secretário Geral da ABL. Discorreu com muita propriedade sobre Memórias de um Sargento de Milícias e Terras do Sem Fim.
Como fecho de ouro, Lygia Fagundes Telles. Tem um enorme prestígio no Paraná. Falou sobre Meus Poemas Preferidos e Seminário dos Ratos. Explicou, de forma pessoal, todos os meandros da sua original construção literária. Quando terminou o seu tempo, foi ovacionada. Uma bela e proveitosa ocasião, rara, diga-se de passagem, para a necessária interação aluno-professor.
Jornal do Commercio (Rio de Janeiro) 16/09/2006