A marcha da humanidade ao longo da história pode ser interpretada (mas não explicada) por duas metáforas que constam do livro mais importante da cultura ocidental: o Paraíso perdido e a torre de Babel. Todo o resto, guerras, invenções, produções da arte ou do pensamento, tudo é balizado pelos dois episódios lendários do “Gênesis”.
O homem foi criado para ser feliz num jardim onde tinha de tudo e tudo podia, menos conhecer o Bem e o Mal – atributo inalienável do Criador. A maçã não é símbolo do ato sexual, como a maioria pensa. No lance com a serpente, o primeiro-casal já tinha filhos nascidos sem proveta. O castigo para o homem foi o suor do trabalho, e, para a mulher, as dores do parto. Marcou o início do longo exílio no qual a humanidade sofre a nostalgia do Paraíso perdido. Camus fala disso em “O Exílio e o Reino”.
O outro episódio foi a torre de Babel. Em busca do Paraíso do qual foram expulsos, os homens começaram a falar diversas línguas, não mais se entenderam, brigaram e separaram-se em tribos e nações. A obra comum foi abandonada. Que cada um, que cada grupo tratasse de si. Daí em diante, não foi encontrada uma tarefa que pudesse unir e reunir todos os homens.
Inconscientemente, a humanidade tenta reencontrar o caminho anterior à Babel, quando todos tinham a mesma linguagem e o mesmo objetivo: recuperar o Paraíso do qual fora expulsa. Dar fim ao exílio e voltar ao jardim que em algum lugar da história a espera.
Duas buscas improváveis. Apesar das tentativas filosóficas, religiosas ou políticas, das evoluções e revoluções, os homens continuarão a não se entender na construção de um sistema – ou torre – que os leve de volta ao jardim para sempre esperado e jamais alcançado.
Jornal do Commercio (RJ) 16/12/2008