O que mais chamou minha atenção, na conferência realizada no Sesc/Osasco, em São Paulo, foi o grande interesse despertado na plateia pela biografia do autor de Auto da compadecida. As perguntas do auditório foram em número apreciável e de boa qualidade, como a que se referiu à forma debochada como Ariano tratava os que, para impressionar, falavam palavras ou expressões em inglês, para ele.
Tratava-se, na verdade, de uma questão de coerência. Defensor intransigente da cultura nordestina, a de suas raízes paraibanas, criador do movimento Armorial e entusiasta do teatro de mamulengos, Ariano sempre preferiu - e da forma mais simples possível - que usássemos nossa língua.
Isso não impediu que fosse um notável leitor dos filósofos gregos, especialmente Aristóteles. Mas foi em Plauto que ele se inspirou para fazer O santo a porca, uma das suas obras-primas. O herói junta dinheiro, colocando numa porquinha de madeira, deixa de pagar os seus empregados, aos quais tratava como escravos, e quando finalmente abre o cofre, para contar a sua "fortuna", dá-se conta de que o dinheiro não valia mais nada. Notas e moedas eram antigas e não tinham mais validade. O diálogo dele com Santo Antônio, para quem confiava os seus segredos, é verdadeiramente lapidar. Quis botar a culpa no santo, pelo desastre, mas no fundo sabe que foi arranjo dele próprio.
Uma aluna, no auditório, quer saber mais sobre o romance de A pedra do reino, que Ariano mesmo chamava de "epopeico". E um rapaz, na primeira fila, queria conhecer mais pormenores da vida política do acadêmico recentemente falecido. A sua dúvida (ou carência de informações) tinha procedência. No começo da palestra, mostrei um vídeo, gravado na Academia Brasileira de Letras, em que Ariano falava, com seu jeito característico, nos muitos convites recebidos inclusive para ser ministro de Estado. Sempre recusou. Mas isso não aconteceu quando o então governador Miguel Arraes convidou-o para ser Secretário de Estado de Cultura de Pernambuco. Aceitou com muito prazer e fez um belo trabalho durante o período de 1994/1998. Incoerência? Não, respeito à amizade com o avô de Eduardo Campos, que ele também apreciava muito, tendo sofrido com a sua trágica morte em desastre de avião.
O projeto Reino encantado de Ariano Suassuna, realização do Sesc-SP com o apoio cultural da Academia Brasileira de Letras, leva um grupo de imortais a falar numa série de cidades, entre as quais Campinas, Santo André e Taubaté. Na oportunidade em que estive em Osasco, na capital paulista, chamei a atenção da plateia para o sucesso de Ariano em diferentes mídias, como o teatro, a televisão e o cinema. O seu Auto da compadecida foi uma histórica e bem sucedida minissérie da Rede Globo, com altíssimos índices de audiência. O mesmo aconteceu no cinema, prova de que a qualidade do texto e da trama é que faz o sucesso da obra, além, é claro, dos artistas muito bem selecionados.