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O general e os ‘malucos’

 

Nas manifestações de rua desses últimos tempos, dois grupos infiltrados ameaçavam a ordem pública — o dos vândalos, promovendo quebra-quebra, e o dos golpistas, pedindo a “volta dos militares”. No primeiro caso, eram bandos de baderneiros; no segundo, mais grave, tratava-se de minorias organizadas propondo ruptura anticonstitucional em nome de setores da sociedade. Por isso é que, em meio à tensão entre os poderes, quando até o Supremo Tribunal Federal foi contaminado pelo jogo da política, soaram como alívio as declarações ao “Estadão” do comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, afirmando que há “chance zero” de setores das Forças Armadas se encantarem com a volta dos militares ao poder. Aos que batem à sua porta pedindo intervenção, sua resposta desanima fantasias de golpe, pelo menos com seu apoio. 

“Esses tresloucados, esses malucos vêm procurar a gente aqui e perguntam: ‘Até quando as Forças Armadas vão deixar o país afundando?’ Eu respondo com o artigo 142 da Constituição. Está tudo ali”. (pelo artigo, Marinha, Exército e Aeronáutica são instituições organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do presidente da República). Segundo o general, os militares aprenderam a lição de 1964. “Estamos escaldados”. Ele relata que se reuniu com o presidente Michel Temer e com o ministro da Defesa, Raul Jungmann, e avisou que a tropa está tranquila e que mesmo a reserva, “sempre mais arisca, mais audaciosa, até o momento está bem, sob controle”. 

Por coincidência, na véspera de ler a entrevista, encontrei-me em reunião social com o ministro da Defesa, que de maneira informal confirmou as declarações do comandante do Exército que seriam publicadas no dia seguinte. Eu estava curioso para saber como se comportavam as Forças Armadas que, para combater o comunismo, instauraram no país uma ditadura em 1964 e agora tinham como superior hierárquico um ex-membro do Partido Comunista. Jungmann exaltou o espírito profissional e a ausência de qualquer ruído nos quartéis. 

Ao presidente Temer, o general Villas Bôas revelou que sua preocupação maior é com a instabilidade social e seu efeito na segurança pública. “Pela Constituição, isso pode nos envolver. Aliás, já envolve, porque o índice de criminalidade é absurdo, com vários estados em situação econômica gravíssima. E uma das consequências é a violência”.

Associo-me a Fernanda Montenegro e Nélida Piñon no protesto pelo fim de um dos melhores programas jornalísticos da TV brasileira, o “Sem Censura”, de Leda Nagle.

O Globo, 14/12/2016