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O Galo e o Cata-Vento

 

O livro de poesia de Mauro Mota - "O Galo e o Cata-Vento" -, que reli recentemente, insiste em caracterizar, cada vez mais, do meu ponto de vista, a pujante riqueza do seu talento de poeta completo. Poeta que não foge ao "engajamento na aventura humana", concorde com Marcel Arland de que tom grave e consciente também vinca à poesia; concorde, é certo, mas sem perder a armosfera de farta inspiração e os lhames de disciplina formal. É o poeta de A Tecelã e do Boletim Sentimental da Guerra no Recife. Poemas de participação.


Poeta, também, em "O Galo e o Cata-Vento", da dor e da solidão transfiguradas em poesia, magistralmente mostrada nas "Elegrias". Sentem-se nesse livro cantos de dor e de solidão, mordendo a gente por dentro, a nós amigos do Mauro impagável, travesso. O trabalho é assim fiel à sua totalidade de poeta, que se renova crescendo dentro das suas perfeições; abusando mesmo de uma imagística que impressiona pelo seu uso prudente. Mauro Mota é verdadeiro artista da clareza.


Como jogo psicológico da criação técnica é o sistema da criação poética; aproxima os distantes; revela os próximos impercebidos. É isso que Mauro faz com as palavras, leais aos sentimentos do poeta, mas de tal modo ajustadas que tudo fica mais junto ao seu leitor, inclusive os poemas de "substância universal". Nele, as palavras agrupam-se, definem, expressam, como nunca acreditaríamos fosse possível. Ensina novos usos, felizes utilizações que às vezes pareciam imprevistas e até, imprudentes. É que seus versos deslizam e nesse deslizar há uma formosura linguística de causar inveja.


O "Galo e o Cata-Vento" é bem Mauro Mota. Não o Mauro repetido, mas o Mauro autêntico, crescendo sempre sem sinuosidades, sem as extravagâncias que em muitos aparecem como formas de despistar o não talento. Essa fidelidade está, por exemplo, no poema Romaria na Capela de São Severino do Ramo, como se apresenta sinteticamente no Passaporte: "Dava adeus a si mesmo / na ponte sobre o cais. / À cada hora partia-se / para não voltar mais". Ou ainda no Itinerante: "Vou em busca do Ter-ido / Desapareço no espaço. / Fica de novo perdido./ Procuro-me, e não me acho".


Diário de Pernambuco, 10/5/2009