Se é verdade que as eleições municipais têm mais influência local do que nacional, seria também um erro recusar que delas emanam os ventos que movem a sociedade na direção do futuro político que se consolidará nas eleições de 2022 para presidente, deputados federais e senadores, essas, sim, reflexos da situação social e econômica.
Em Recife, a disputa familiar mais dramática também ganhou contornos nacionais. Ali está a única chance de o PT vencer em uma capital importante, e a esquerda rachou com o PSB.
A vitória na eleição presidencial depende muito da estrutura partidária montada a partir das municipais. Mas por vezes tivemos fenômenos pessoais, independentes dos partidos, que se impuseram nas urnas, como Jânio Quadros, Collor de Mello, Fernando Henrique Cardoso com o Real, mais recentemente Bolsonaro.
Lula não se pode chamar de um vencedor pessoal, pois já estivera nas urnas eleitorais por três oportunidades e tinha uma estrutura partidária que foi se consolidando ao longo dessa caminhada. Acabou maior que o PT, mas também a razão da debilidade do partido, seja pelas condenações por corrupção, ou pela incapacidade de permitir a ação de novas lideranças partidárias.
Bolsonaro é exemplar de um candidato que parecia um outsider mesmo depois de mais de 30 anos de mandatos parlamentares sucessivos, e demonstrou um faro político excepcional ao prever um espaço na direita nacional que, a partir de 2013, vinha se impondo nas manifestações políticas contrárias aos governos petistas.
Assim como o PT gosta de jogar todos seus adversários para a direita, também Bolsonaro jogou o PT para a extrema esquerda, propiciando uma polarização entre a extrema-direita e a extrema-esquerda. A centro-direita teve que ir para Bolsonaro, pois não houve uma candidatura com capacidade de confrontar a extrema-direita com uma proposta que se mostrasse vencedora contra o PT.
Bolsonaro não tem espírito para ir para o centro. Lula era um líder sindical que sabia negociar, Bolsonaro é um líder que quer se impor na base do grito e da opressão do poder temporário que a presidência lhe dá.
Aquele momento de 2018, quando a prisão de Lula radicalizou o cenário politico, foi superado pela realidade de um governo inepto que paralisou o país por dois anos devido a uma maneira de fazer política que destrói sem construir nada em seu redor.
O cansaço do cidadão comum com Bolsonaro e seus aloprados que tentam, ainda hoje, derrubar o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF), não deu margem a que a esquerda se fortalecesse, porém. A direita saiu vitoriosa, mas não a direita extremista. Os partidos que mais elegeram prefeitos foram MDB, PP, PSD, PSDB e DEM. Apenas três partidos tiveram mais de 10 milhões de votos: MDB, PSD e PSDB.
Apenas cinco partidos fizeram mais de 400 prefeitos e quatro mil vereadores: MDB, PP, PSD, PSDB e DEM. Se fizermos de conta, como fizeram assessores palacianos, que o presidente Bolsonaro é do Centrão, ele saiu vitorioso da eleição. Se formos para a realidade, ele saiu derrotado na maioria esmagadora de suas indicações e mais dependente ainda do Centrão.
Uma demonstração clara de que ele hoje depende mais dos partidos do Centrão do que o Centrão dele: o Republicanos, que filiou dois filhos de Bolsonaro e sua ex-mulher que não foi eleita, disse, através do presidente Marcos Pereira não haver hipótese de oferecer a Bolsonaro o controle do partido. O PSD já disse que não é da base bolsonarista nem do Centrão, mantendo uma independência que as urnas lhe deram. O PP tem dono, o senador Ciro Nogueira, assim como o PTB, do ex-deputado Roberto Jefferson.
Não conseguindo organizar seu partido, Bolsonaro depende do Centrão para se resguardar de um impeachment - garantia relativa essa - e montar um esquema partidário para a tentar a reeleição. Não é mais aquele fator fora da curva que hipnotizou o eleitorado.